Georges Wambach (Antuérpia, Bélgica, 1 de outubro de 1901 — Rio de Janeiro, RJ, 4 de fevereiro de 1965) foi um pintor, desenhista e aquarelista belga radicado no Brasil. Era conhecido como o andarilho da pintura e obteve muito sucesso com suas aquarelas.
Biografia - Itaú Cultural
Recebeu algumas orientações de sua mãe, a pintora Marie Wambach de Duve. Passou a desenhar cartões-postais e rótulos de remédios. Mudou-se para Londres, na Inglaterra, em virtude da Primeira Guerra Mundial, em 1914.Com o final do conflito, voltou a viver em Antuérpia, em 1918. Em 1926 passou a se dedicar à pintura e ao desenho, em Bruxelas, Bélgica. Mudou-se para o Rio de Janeiro, onde fixou residência, no ano de 1933.Ao longo das décadas seguintes, efetuou numerosas viagens pelo Brasil, visitando as cidades históricas mineiras, o Nordeste e a Amazônia. Retornava dessas verdadeiras expedições artísticas, com novas pinturas e aquarelas e com seus livros de apontamentos repletos de esboços e croquis. Foi lançado o livro Aquarelas de Georges Wambach: impressões do Brasil, organizado por Margarida Cintra Gordinho e Sylvia Monteiro, em 1988.
Exposições individuais
1938 – Galerie de La Toison D´Or, Bruxelas.
1942 – Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
1945 – Galeria Montparnasse, Rio de Janeiro.
Exposições coletivas
1939 – 45º Salão Nacional de Belas Artes, Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
Exposições póstumas
1982 – Wambach, Renato Magalhães Gouvêa Escritório de Arte, São Paulo.
1986 – Exposição de desenhos eróticos, Rio de Janeiro.
1995 – Caminhos das Águas, Fundação Cultural do Município de Belém, Belém, PA.
Fonte: GEORGES Wambach. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 17 de Ago. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
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Wambach, o pintor andarilho
Georges Wambach (1901-1965), filho de Emile Xavier Wambach e Marie Wambach de Duve, nasceu na Antuérpia/Bélgica, sendo o caçula de 5 filhos do casal, e morreu no Rio de Janeiro. Quem lhe deu o cognome de “andarilho da pintura” foi o crítico José Roberto Teixeira Leite, com certeza pelo fato de que Wambach viajava pelo Brasil afora, com cavalete, paleta, tintas e pincéis na mochila, registrando em pequenos álbuns uma grande variedade de locais desse imenso e belíssimo Brasil. Foi um dos artistas que mais contribuíram para a iconografia brasileira.
Autodidata, sua formação artística foi a vivência do ambiente familiar, em sua cidade natal. Seu pai era músico e sua mãe, pintora. Os trópicos entraram na vida de Wambach pelas mãos de uma francesa. Na década de 20, conheceu Edith Blin, que trabalhava como atriz no Teatro Molière, em Bruxelas. Em 1935, Wambach veio ao Brasil com Edith e se encantou com as paisagens e as mulatas. Mas, em 1937/38, ele voltou à Europa, tendo pintado um magnífico óleo sobre tela, o “Pommiers en fleur“, datado de 1937, feito em frente à casa onde morava Edith na Normandia. A obra representa uma paisagem da região, com macieiras em flor e possui uma dedicatória a Edith: “À Edith Blin de A. – son ami G. W.”
Em 1942, abriu-se a primeira exposição de Wambach no Brasil, no Salão do Museu Nacional de Belas Artes. Em telas a óleo, aquarelas e bicos-de-pena, o seu temário se mostrava em toda a sua amplitude. São paisagens brasileiras e europeias, além de vários interiores de igrejas barrocas. Eram as primeiras impressões de viagens pelo Brasil e evidenciavam o seu encanto pela luz e pelas cores apreendidas com maestria nas transparências da aquarela. Ao lado dessa produção formal, o pintor trabalhou em áreas alternativas, desenhando rótulos de remédios para laboratórios, cartões postais, colaborando em revistas como A Revista da Semana e Dom Casmurro. Esta última, no número de Natal 1943, publica várias aquarelas de Wambach, tendo como tema o cenário urbano do Rio de Janeiro: o Palácio Monroe, a praça Paris, o Theatro Municipal e a praça da Glória.
Nos anos 80, iniciei a catalogação das obras de Edith Blin e, tendo ouvido relatos de pessoas que tinham convivido com o casal Edith e Wambach, resolvi catalogar também a sua obra. Este fato me fez chegar ao projeto de publicação do livro “Aquarelas de Georges Wambach – Impressões do Brasil“, financiado pelo Banco Itaú, que havia adquirido um dos álbuns de aquarelas do pintor. Fui chamada por Margarida Cintra, da editora Marca d’Água, para participar do conteúdo da publicação e fiquei muito feliz em contribuir com tão belo trabalho! Abaixo, duas das obras que constam do livro.
Embora Wambach seja mais conhecido pelas suas aquarelas e bicos de pena, representando paisagens de todo o Brasil, ele também fez muitos retratos e produziu um grande número de obras eróticas. Bem antes de Di Cavalcanti, as mulatas brasileiras já faziam parte de quadros pintados por Wambach. Mas isso é tema para outro post…
Fonte: Arte na Rede, publicado por Catherine Beltrão em 19 de junho de 2014.
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Georges Wambach no ceará
Na parede da sala de dona Lúcia destacava-se uma pintura de seu rosto: jovem, cabelos cacheados, atraíam-nos os seus olhos límpidos, oceânicos, na cor dos nossos mares bravios, olhos argutos e afetuosos. O pintor era bom retratista, de extremo bom gosto e sensibilidade. Dona Lúcia me disse que se tratava de Georges Wambach, um pintor viajante belga que visitara o sítio de Messejana nos anos 1950, e fizera também aquarelas e bicos de pena da paisagem local, com a lagoa, as majestosas árvores e variadas plantas. E ela me mostrou uma paisagem pintada a óleo, com a mesma maestria e requinte do retrato. Wambach, disse dona Lúcia, passava longas horas no meio dos cajueiros, das mangueiras, ou na beira da lagoa de Messejana, diante de seu cavalete, pincel na mão, trabalhando com aquarela ou com tinta a óleo.
Por uma dessas misteriosas coincidências da vida, após essa conversa um gentil leitor me presenteou um livro, Impressões do Brasil, com aquarelas e a curiosa biografia desse pintor viajante. Nascido na Antuérpia, era filho de um importante músico, maestro e compositor; e de uma talentosa pintora de animais e marinhas que passou ao filho as noções iniciais de pintura. Durante a Primeira Grande Guerra a família se refugiou em Londres, temendo a ocupação da Bélgica pelos alemães.
Na volta para a Antuérpia, após o fim da guerra, passando por Bordeaux, o rapaz de 16 anos recebeu de presente de um major general um álbum de autógrafos que o acompanharia por toda a vida. Dona Lúcia chegou a ver esse álbum, quando foi com o marido visitar o atelier do amigo na avenida Niemeyer, no Rio. Havia assinaturas de Napoleão Bonaparte, dos reis da Bélgica, da Inglaterra, da Itália, da Espanha, de políticos como Churchill ou Mussolini, de músicos, como Gounod ou Saint-Saëns, que eram amigos de seu pai. E assinaturas de renomados brasileiros, como Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek; até alguns poemas de Carlos Drummond, manuscritos pelo próprio poeta naquelas páginas que Wambach gostava de mostrar a todos, como uma confirmação de seu espírito amistoso e de sua relevância social.
Riso espontâneo, boêmio, divertido, casou-se muito cedo, e o casamento durou pouco. Após a separação, o rapaz saiu do emprego como contador num banco e dedicou-se à sua arte. Morava então em Bruxelas, onde se apaixonou por uma atriz de teatro, Edith Blin, casada com um diplomata brasileiro que servia na Bélgica. Foi na companhia de Edith que Wambach pisou pela primeira vez o Brasil, em 1935, fugindo do fascismo que, segundo ele, sufocava a vida artística europeia. As cores, luzes, a vegetação tropical, as nossas paisagens, nossos rostos, incendiaram a arte de Wambach. Sua primeira exposição brasileira, em 1942, mostrou impressões de viagens que realizava pelo País, em aviões da FAB. Em 1945 fez sua última exposição; nunca mais conseguiria juntar seus trabalhos, vendidos ou presenteados na medida de suas necessidades de dinheiro ou de relações. Apreciava a vida noturna, a boa mesa, as morenas, e uma boa cerveja gelada. Seu filho relembra que, quando veio ver o pai, Wambach ficou preocupado com o que iam comer, pois na geladeira só havia champanhe e foie gras.
Seu roteiro de viagens é requintado e impressionante. Wambach pintou imagens bucólicas da ilha de Paquetá, do Rio; cenas de Vitória e Anchieta no Espírito Santo; de Manaus, Apuí, Parintins, no Amazonas; Boca do Riozinho no Acre; Belém do Pará; Itapuã, Itaparica, cenas e personagens da Bahia; de Japaratuba em Sergipe; imagens do Maranhão; de Olinda, Fernando de Noronha e Igarassu, em Pernambuco; Sabará, Ouro Preto, Diamantina, Congonhas, Itabira, Belo Horizonte, em Minas. Ilha Bela e São Sebastião, São Paulo. No Ceará, pintou a Casa de José de Alencar, a praça dos Leões, Maranguape, o farol de Mucuripe... O andarilho tinha o cuidado de levar suas obras aos correios de cada cidade, para serem carimbadas, comprovando assim que tinham sido feitas no local.
Dona Lúcia guardava cartas de Wambach, escritas ora em francês, ora num bom português. Vinham de Londres, Paris, em papel timbrado de algum hotel, ou mesmo da Companhia de Navegação Costeira, no Rio; ou da Antuérpia, anunciando que o artista ia para Madri, Gibraltar, Casablanca, ou voltava ao Rio. Um cabograma chegou em inglês, cumprimentando a amiga em seu aniversário, que era em 6 de maio: “Nice sweet and happy birthday to you May every night and day always be spring for you”. Já se foram dona Lúcia, Georges Wambach, e tantos outros seres inesquecíveis. Mas cá estão os retratos, as cartas, os livros, atenuando as saudades em nosso coração.
Fonte: O Povo, por Ana miranda, publicado em 17 de maio de 2015.
Georges Wambach (Antuérpia, Bélgica, 1 de outubro de 1901 — Rio de Janeiro, RJ, 4 de fevereiro de 1965) foi um pintor, desenhista e aquarelista belga radicado no Brasil. Era conhecido como o andarilho da pintura e obteve muito sucesso com suas aquarelas.
Biografia - Itaú Cultural
Recebeu algumas orientações de sua mãe, a pintora Marie Wambach de Duve. Passou a desenhar cartões-postais e rótulos de remédios. Mudou-se para Londres, na Inglaterra, em virtude da Primeira Guerra Mundial, em 1914.Com o final do conflito, voltou a viver em Antuérpia, em 1918. Em 1926 passou a se dedicar à pintura e ao desenho, em Bruxelas, Bélgica. Mudou-se para o Rio de Janeiro, onde fixou residência, no ano de 1933.Ao longo das décadas seguintes, efetuou numerosas viagens pelo Brasil, visitando as cidades históricas mineiras, o Nordeste e a Amazônia. Retornava dessas verdadeiras expedições artísticas, com novas pinturas e aquarelas e com seus livros de apontamentos repletos de esboços e croquis. Foi lançado o livro Aquarelas de Georges Wambach: impressões do Brasil, organizado por Margarida Cintra Gordinho e Sylvia Monteiro, em 1988.
Exposições individuais
1938 – Galerie de La Toison D´Or, Bruxelas.
1942 – Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
1945 – Galeria Montparnasse, Rio de Janeiro.
Exposições coletivas
1939 – 45º Salão Nacional de Belas Artes, Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
Exposições póstumas
1982 – Wambach, Renato Magalhães Gouvêa Escritório de Arte, São Paulo.
1986 – Exposição de desenhos eróticos, Rio de Janeiro.
1995 – Caminhos das Águas, Fundação Cultural do Município de Belém, Belém, PA.
Fonte: GEORGES Wambach. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 17 de Ago. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
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Wambach, o pintor andarilho
Georges Wambach (1901-1965), filho de Emile Xavier Wambach e Marie Wambach de Duve, nasceu na Antuérpia/Bélgica, sendo o caçula de 5 filhos do casal, e morreu no Rio de Janeiro. Quem lhe deu o cognome de “andarilho da pintura” foi o crítico José Roberto Teixeira Leite, com certeza pelo fato de que Wambach viajava pelo Brasil afora, com cavalete, paleta, tintas e pincéis na mochila, registrando em pequenos álbuns uma grande variedade de locais desse imenso e belíssimo Brasil. Foi um dos artistas que mais contribuíram para a iconografia brasileira.
Autodidata, sua formação artística foi a vivência do ambiente familiar, em sua cidade natal. Seu pai era músico e sua mãe, pintora. Os trópicos entraram na vida de Wambach pelas mãos de uma francesa. Na década de 20, conheceu Edith Blin, que trabalhava como atriz no Teatro Molière, em Bruxelas. Em 1935, Wambach veio ao Brasil com Edith e se encantou com as paisagens e as mulatas. Mas, em 1937/38, ele voltou à Europa, tendo pintado um magnífico óleo sobre tela, o “Pommiers en fleur“, datado de 1937, feito em frente à casa onde morava Edith na Normandia. A obra representa uma paisagem da região, com macieiras em flor e possui uma dedicatória a Edith: “À Edith Blin de A. – son ami G. W.”
Em 1942, abriu-se a primeira exposição de Wambach no Brasil, no Salão do Museu Nacional de Belas Artes. Em telas a óleo, aquarelas e bicos-de-pena, o seu temário se mostrava em toda a sua amplitude. São paisagens brasileiras e europeias, além de vários interiores de igrejas barrocas. Eram as primeiras impressões de viagens pelo Brasil e evidenciavam o seu encanto pela luz e pelas cores apreendidas com maestria nas transparências da aquarela. Ao lado dessa produção formal, o pintor trabalhou em áreas alternativas, desenhando rótulos de remédios para laboratórios, cartões postais, colaborando em revistas como A Revista da Semana e Dom Casmurro. Esta última, no número de Natal 1943, publica várias aquarelas de Wambach, tendo como tema o cenário urbano do Rio de Janeiro: o Palácio Monroe, a praça Paris, o Theatro Municipal e a praça da Glória.
Nos anos 80, iniciei a catalogação das obras de Edith Blin e, tendo ouvido relatos de pessoas que tinham convivido com o casal Edith e Wambach, resolvi catalogar também a sua obra. Este fato me fez chegar ao projeto de publicação do livro “Aquarelas de Georges Wambach – Impressões do Brasil“, financiado pelo Banco Itaú, que havia adquirido um dos álbuns de aquarelas do pintor. Fui chamada por Margarida Cintra, da editora Marca d’Água, para participar do conteúdo da publicação e fiquei muito feliz em contribuir com tão belo trabalho! Abaixo, duas das obras que constam do livro.
Embora Wambach seja mais conhecido pelas suas aquarelas e bicos de pena, representando paisagens de todo o Brasil, ele também fez muitos retratos e produziu um grande número de obras eróticas. Bem antes de Di Cavalcanti, as mulatas brasileiras já faziam parte de quadros pintados por Wambach. Mas isso é tema para outro post…
Fonte: Arte na Rede, publicado por Catherine Beltrão em 19 de junho de 2014.
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Georges Wambach no ceará
Na parede da sala de dona Lúcia destacava-se uma pintura de seu rosto: jovem, cabelos cacheados, atraíam-nos os seus olhos límpidos, oceânicos, na cor dos nossos mares bravios, olhos argutos e afetuosos. O pintor era bom retratista, de extremo bom gosto e sensibilidade. Dona Lúcia me disse que se tratava de Georges Wambach, um pintor viajante belga que visitara o sítio de Messejana nos anos 1950, e fizera também aquarelas e bicos de pena da paisagem local, com a lagoa, as majestosas árvores e variadas plantas. E ela me mostrou uma paisagem pintada a óleo, com a mesma maestria e requinte do retrato. Wambach, disse dona Lúcia, passava longas horas no meio dos cajueiros, das mangueiras, ou na beira da lagoa de Messejana, diante de seu cavalete, pincel na mão, trabalhando com aquarela ou com tinta a óleo.
Por uma dessas misteriosas coincidências da vida, após essa conversa um gentil leitor me presenteou um livro, Impressões do Brasil, com aquarelas e a curiosa biografia desse pintor viajante. Nascido na Antuérpia, era filho de um importante músico, maestro e compositor; e de uma talentosa pintora de animais e marinhas que passou ao filho as noções iniciais de pintura. Durante a Primeira Grande Guerra a família se refugiou em Londres, temendo a ocupação da Bélgica pelos alemães.
Na volta para a Antuérpia, após o fim da guerra, passando por Bordeaux, o rapaz de 16 anos recebeu de presente de um major general um álbum de autógrafos que o acompanharia por toda a vida. Dona Lúcia chegou a ver esse álbum, quando foi com o marido visitar o atelier do amigo na avenida Niemeyer, no Rio. Havia assinaturas de Napoleão Bonaparte, dos reis da Bélgica, da Inglaterra, da Itália, da Espanha, de políticos como Churchill ou Mussolini, de músicos, como Gounod ou Saint-Saëns, que eram amigos de seu pai. E assinaturas de renomados brasileiros, como Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek; até alguns poemas de Carlos Drummond, manuscritos pelo próprio poeta naquelas páginas que Wambach gostava de mostrar a todos, como uma confirmação de seu espírito amistoso e de sua relevância social.
Riso espontâneo, boêmio, divertido, casou-se muito cedo, e o casamento durou pouco. Após a separação, o rapaz saiu do emprego como contador num banco e dedicou-se à sua arte. Morava então em Bruxelas, onde se apaixonou por uma atriz de teatro, Edith Blin, casada com um diplomata brasileiro que servia na Bélgica. Foi na companhia de Edith que Wambach pisou pela primeira vez o Brasil, em 1935, fugindo do fascismo que, segundo ele, sufocava a vida artística europeia. As cores, luzes, a vegetação tropical, as nossas paisagens, nossos rostos, incendiaram a arte de Wambach. Sua primeira exposição brasileira, em 1942, mostrou impressões de viagens que realizava pelo País, em aviões da FAB. Em 1945 fez sua última exposição; nunca mais conseguiria juntar seus trabalhos, vendidos ou presenteados na medida de suas necessidades de dinheiro ou de relações. Apreciava a vida noturna, a boa mesa, as morenas, e uma boa cerveja gelada. Seu filho relembra que, quando veio ver o pai, Wambach ficou preocupado com o que iam comer, pois na geladeira só havia champanhe e foie gras.
Seu roteiro de viagens é requintado e impressionante. Wambach pintou imagens bucólicas da ilha de Paquetá, do Rio; cenas de Vitória e Anchieta no Espírito Santo; de Manaus, Apuí, Parintins, no Amazonas; Boca do Riozinho no Acre; Belém do Pará; Itapuã, Itaparica, cenas e personagens da Bahia; de Japaratuba em Sergipe; imagens do Maranhão; de Olinda, Fernando de Noronha e Igarassu, em Pernambuco; Sabará, Ouro Preto, Diamantina, Congonhas, Itabira, Belo Horizonte, em Minas. Ilha Bela e São Sebastião, São Paulo. No Ceará, pintou a Casa de José de Alencar, a praça dos Leões, Maranguape, o farol de Mucuripe... O andarilho tinha o cuidado de levar suas obras aos correios de cada cidade, para serem carimbadas, comprovando assim que tinham sido feitas no local.
Dona Lúcia guardava cartas de Wambach, escritas ora em francês, ora num bom português. Vinham de Londres, Paris, em papel timbrado de algum hotel, ou mesmo da Companhia de Navegação Costeira, no Rio; ou da Antuérpia, anunciando que o artista ia para Madri, Gibraltar, Casablanca, ou voltava ao Rio. Um cabograma chegou em inglês, cumprimentando a amiga em seu aniversário, que era em 6 de maio: “Nice sweet and happy birthday to you May every night and day always be spring for you”. Já se foram dona Lúcia, Georges Wambach, e tantos outros seres inesquecíveis. Mas cá estão os retratos, as cartas, os livros, atenuando as saudades em nosso coração.
Fonte: O Povo, por Ana miranda, publicado em 17 de maio de 2015.
Georges Wambach (Antuérpia, Bélgica, 1 de outubro de 1901 — Rio de Janeiro, RJ, 4 de fevereiro de 1965) foi um pintor, desenhista e aquarelista belga radicado no Brasil. Era conhecido como o andarilho da pintura e obteve muito sucesso com suas aquarelas.
Biografia - Itaú Cultural
Recebeu algumas orientações de sua mãe, a pintora Marie Wambach de Duve. Passou a desenhar cartões-postais e rótulos de remédios. Mudou-se para Londres, na Inglaterra, em virtude da Primeira Guerra Mundial, em 1914.Com o final do conflito, voltou a viver em Antuérpia, em 1918. Em 1926 passou a se dedicar à pintura e ao desenho, em Bruxelas, Bélgica. Mudou-se para o Rio de Janeiro, onde fixou residência, no ano de 1933.Ao longo das décadas seguintes, efetuou numerosas viagens pelo Brasil, visitando as cidades históricas mineiras, o Nordeste e a Amazônia. Retornava dessas verdadeiras expedições artísticas, com novas pinturas e aquarelas e com seus livros de apontamentos repletos de esboços e croquis. Foi lançado o livro Aquarelas de Georges Wambach: impressões do Brasil, organizado por Margarida Cintra Gordinho e Sylvia Monteiro, em 1988.
Exposições individuais
1938 – Galerie de La Toison D´Or, Bruxelas.
1942 – Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
1945 – Galeria Montparnasse, Rio de Janeiro.
Exposições coletivas
1939 – 45º Salão Nacional de Belas Artes, Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
Exposições póstumas
1982 – Wambach, Renato Magalhães Gouvêa Escritório de Arte, São Paulo.
1986 – Exposição de desenhos eróticos, Rio de Janeiro.
1995 – Caminhos das Águas, Fundação Cultural do Município de Belém, Belém, PA.
Fonte: GEORGES Wambach. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 17 de Ago. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
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Wambach, o pintor andarilho
Georges Wambach (1901-1965), filho de Emile Xavier Wambach e Marie Wambach de Duve, nasceu na Antuérpia/Bélgica, sendo o caçula de 5 filhos do casal, e morreu no Rio de Janeiro. Quem lhe deu o cognome de “andarilho da pintura” foi o crítico José Roberto Teixeira Leite, com certeza pelo fato de que Wambach viajava pelo Brasil afora, com cavalete, paleta, tintas e pincéis na mochila, registrando em pequenos álbuns uma grande variedade de locais desse imenso e belíssimo Brasil. Foi um dos artistas que mais contribuíram para a iconografia brasileira.
Autodidata, sua formação artística foi a vivência do ambiente familiar, em sua cidade natal. Seu pai era músico e sua mãe, pintora. Os trópicos entraram na vida de Wambach pelas mãos de uma francesa. Na década de 20, conheceu Edith Blin, que trabalhava como atriz no Teatro Molière, em Bruxelas. Em 1935, Wambach veio ao Brasil com Edith e se encantou com as paisagens e as mulatas. Mas, em 1937/38, ele voltou à Europa, tendo pintado um magnífico óleo sobre tela, o “Pommiers en fleur“, datado de 1937, feito em frente à casa onde morava Edith na Normandia. A obra representa uma paisagem da região, com macieiras em flor e possui uma dedicatória a Edith: “À Edith Blin de A. – son ami G. W.”
Em 1942, abriu-se a primeira exposição de Wambach no Brasil, no Salão do Museu Nacional de Belas Artes. Em telas a óleo, aquarelas e bicos-de-pena, o seu temário se mostrava em toda a sua amplitude. São paisagens brasileiras e europeias, além de vários interiores de igrejas barrocas. Eram as primeiras impressões de viagens pelo Brasil e evidenciavam o seu encanto pela luz e pelas cores apreendidas com maestria nas transparências da aquarela. Ao lado dessa produção formal, o pintor trabalhou em áreas alternativas, desenhando rótulos de remédios para laboratórios, cartões postais, colaborando em revistas como A Revista da Semana e Dom Casmurro. Esta última, no número de Natal 1943, publica várias aquarelas de Wambach, tendo como tema o cenário urbano do Rio de Janeiro: o Palácio Monroe, a praça Paris, o Theatro Municipal e a praça da Glória.
Nos anos 80, iniciei a catalogação das obras de Edith Blin e, tendo ouvido relatos de pessoas que tinham convivido com o casal Edith e Wambach, resolvi catalogar também a sua obra. Este fato me fez chegar ao projeto de publicação do livro “Aquarelas de Georges Wambach – Impressões do Brasil“, financiado pelo Banco Itaú, que havia adquirido um dos álbuns de aquarelas do pintor. Fui chamada por Margarida Cintra, da editora Marca d’Água, para participar do conteúdo da publicação e fiquei muito feliz em contribuir com tão belo trabalho! Abaixo, duas das obras que constam do livro.
Embora Wambach seja mais conhecido pelas suas aquarelas e bicos de pena, representando paisagens de todo o Brasil, ele também fez muitos retratos e produziu um grande número de obras eróticas. Bem antes de Di Cavalcanti, as mulatas brasileiras já faziam parte de quadros pintados por Wambach. Mas isso é tema para outro post…
Fonte: Arte na Rede, publicado por Catherine Beltrão em 19 de junho de 2014.
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Georges Wambach no ceará
Na parede da sala de dona Lúcia destacava-se uma pintura de seu rosto: jovem, cabelos cacheados, atraíam-nos os seus olhos límpidos, oceânicos, na cor dos nossos mares bravios, olhos argutos e afetuosos. O pintor era bom retratista, de extremo bom gosto e sensibilidade. Dona Lúcia me disse que se tratava de Georges Wambach, um pintor viajante belga que visitara o sítio de Messejana nos anos 1950, e fizera também aquarelas e bicos de pena da paisagem local, com a lagoa, as majestosas árvores e variadas plantas. E ela me mostrou uma paisagem pintada a óleo, com a mesma maestria e requinte do retrato. Wambach, disse dona Lúcia, passava longas horas no meio dos cajueiros, das mangueiras, ou na beira da lagoa de Messejana, diante de seu cavalete, pincel na mão, trabalhando com aquarela ou com tinta a óleo.
Por uma dessas misteriosas coincidências da vida, após essa conversa um gentil leitor me presenteou um livro, Impressões do Brasil, com aquarelas e a curiosa biografia desse pintor viajante. Nascido na Antuérpia, era filho de um importante músico, maestro e compositor; e de uma talentosa pintora de animais e marinhas que passou ao filho as noções iniciais de pintura. Durante a Primeira Grande Guerra a família se refugiou em Londres, temendo a ocupação da Bélgica pelos alemães.
Na volta para a Antuérpia, após o fim da guerra, passando por Bordeaux, o rapaz de 16 anos recebeu de presente de um major general um álbum de autógrafos que o acompanharia por toda a vida. Dona Lúcia chegou a ver esse álbum, quando foi com o marido visitar o atelier do amigo na avenida Niemeyer, no Rio. Havia assinaturas de Napoleão Bonaparte, dos reis da Bélgica, da Inglaterra, da Itália, da Espanha, de políticos como Churchill ou Mussolini, de músicos, como Gounod ou Saint-Saëns, que eram amigos de seu pai. E assinaturas de renomados brasileiros, como Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek; até alguns poemas de Carlos Drummond, manuscritos pelo próprio poeta naquelas páginas que Wambach gostava de mostrar a todos, como uma confirmação de seu espírito amistoso e de sua relevância social.
Riso espontâneo, boêmio, divertido, casou-se muito cedo, e o casamento durou pouco. Após a separação, o rapaz saiu do emprego como contador num banco e dedicou-se à sua arte. Morava então em Bruxelas, onde se apaixonou por uma atriz de teatro, Edith Blin, casada com um diplomata brasileiro que servia na Bélgica. Foi na companhia de Edith que Wambach pisou pela primeira vez o Brasil, em 1935, fugindo do fascismo que, segundo ele, sufocava a vida artística europeia. As cores, luzes, a vegetação tropical, as nossas paisagens, nossos rostos, incendiaram a arte de Wambach. Sua primeira exposição brasileira, em 1942, mostrou impressões de viagens que realizava pelo País, em aviões da FAB. Em 1945 fez sua última exposição; nunca mais conseguiria juntar seus trabalhos, vendidos ou presenteados na medida de suas necessidades de dinheiro ou de relações. Apreciava a vida noturna, a boa mesa, as morenas, e uma boa cerveja gelada. Seu filho relembra que, quando veio ver o pai, Wambach ficou preocupado com o que iam comer, pois na geladeira só havia champanhe e foie gras.
Seu roteiro de viagens é requintado e impressionante. Wambach pintou imagens bucólicas da ilha de Paquetá, do Rio; cenas de Vitória e Anchieta no Espírito Santo; de Manaus, Apuí, Parintins, no Amazonas; Boca do Riozinho no Acre; Belém do Pará; Itapuã, Itaparica, cenas e personagens da Bahia; de Japaratuba em Sergipe; imagens do Maranhão; de Olinda, Fernando de Noronha e Igarassu, em Pernambuco; Sabará, Ouro Preto, Diamantina, Congonhas, Itabira, Belo Horizonte, em Minas. Ilha Bela e São Sebastião, São Paulo. No Ceará, pintou a Casa de José de Alencar, a praça dos Leões, Maranguape, o farol de Mucuripe... O andarilho tinha o cuidado de levar suas obras aos correios de cada cidade, para serem carimbadas, comprovando assim que tinham sido feitas no local.
Dona Lúcia guardava cartas de Wambach, escritas ora em francês, ora num bom português. Vinham de Londres, Paris, em papel timbrado de algum hotel, ou mesmo da Companhia de Navegação Costeira, no Rio; ou da Antuérpia, anunciando que o artista ia para Madri, Gibraltar, Casablanca, ou voltava ao Rio. Um cabograma chegou em inglês, cumprimentando a amiga em seu aniversário, que era em 6 de maio: “Nice sweet and happy birthday to you May every night and day always be spring for you”. Já se foram dona Lúcia, Georges Wambach, e tantos outros seres inesquecíveis. Mas cá estão os retratos, as cartas, os livros, atenuando as saudades em nosso coração.
Fonte: O Povo, por Ana miranda, publicado em 17 de maio de 2015.
Georges Wambach (Antuérpia, Bélgica, 1 de outubro de 1901 — Rio de Janeiro, RJ, 4 de fevereiro de 1965) foi um pintor, desenhista e aquarelista belga radicado no Brasil. Era conhecido como o andarilho da pintura e obteve muito sucesso com suas aquarelas.
Biografia - Itaú Cultural
Recebeu algumas orientações de sua mãe, a pintora Marie Wambach de Duve. Passou a desenhar cartões-postais e rótulos de remédios. Mudou-se para Londres, na Inglaterra, em virtude da Primeira Guerra Mundial, em 1914.Com o final do conflito, voltou a viver em Antuérpia, em 1918. Em 1926 passou a se dedicar à pintura e ao desenho, em Bruxelas, Bélgica. Mudou-se para o Rio de Janeiro, onde fixou residência, no ano de 1933.Ao longo das décadas seguintes, efetuou numerosas viagens pelo Brasil, visitando as cidades históricas mineiras, o Nordeste e a Amazônia. Retornava dessas verdadeiras expedições artísticas, com novas pinturas e aquarelas e com seus livros de apontamentos repletos de esboços e croquis. Foi lançado o livro Aquarelas de Georges Wambach: impressões do Brasil, organizado por Margarida Cintra Gordinho e Sylvia Monteiro, em 1988.
Exposições individuais
1938 – Galerie de La Toison D´Or, Bruxelas.
1942 – Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
1945 – Galeria Montparnasse, Rio de Janeiro.
Exposições coletivas
1939 – 45º Salão Nacional de Belas Artes, Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
Exposições póstumas
1982 – Wambach, Renato Magalhães Gouvêa Escritório de Arte, São Paulo.
1986 – Exposição de desenhos eróticos, Rio de Janeiro.
1995 – Caminhos das Águas, Fundação Cultural do Município de Belém, Belém, PA.
Fonte: GEORGES Wambach. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 17 de Ago. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
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Wambach, o pintor andarilho
Georges Wambach (1901-1965), filho de Emile Xavier Wambach e Marie Wambach de Duve, nasceu na Antuérpia/Bélgica, sendo o caçula de 5 filhos do casal, e morreu no Rio de Janeiro. Quem lhe deu o cognome de “andarilho da pintura” foi o crítico José Roberto Teixeira Leite, com certeza pelo fato de que Wambach viajava pelo Brasil afora, com cavalete, paleta, tintas e pincéis na mochila, registrando em pequenos álbuns uma grande variedade de locais desse imenso e belíssimo Brasil. Foi um dos artistas que mais contribuíram para a iconografia brasileira.
Autodidata, sua formação artística foi a vivência do ambiente familiar, em sua cidade natal. Seu pai era músico e sua mãe, pintora. Os trópicos entraram na vida de Wambach pelas mãos de uma francesa. Na década de 20, conheceu Edith Blin, que trabalhava como atriz no Teatro Molière, em Bruxelas. Em 1935, Wambach veio ao Brasil com Edith e se encantou com as paisagens e as mulatas. Mas, em 1937/38, ele voltou à Europa, tendo pintado um magnífico óleo sobre tela, o “Pommiers en fleur“, datado de 1937, feito em frente à casa onde morava Edith na Normandia. A obra representa uma paisagem da região, com macieiras em flor e possui uma dedicatória a Edith: “À Edith Blin de A. – son ami G. W.”
Em 1942, abriu-se a primeira exposição de Wambach no Brasil, no Salão do Museu Nacional de Belas Artes. Em telas a óleo, aquarelas e bicos-de-pena, o seu temário se mostrava em toda a sua amplitude. São paisagens brasileiras e europeias, além de vários interiores de igrejas barrocas. Eram as primeiras impressões de viagens pelo Brasil e evidenciavam o seu encanto pela luz e pelas cores apreendidas com maestria nas transparências da aquarela. Ao lado dessa produção formal, o pintor trabalhou em áreas alternativas, desenhando rótulos de remédios para laboratórios, cartões postais, colaborando em revistas como A Revista da Semana e Dom Casmurro. Esta última, no número de Natal 1943, publica várias aquarelas de Wambach, tendo como tema o cenário urbano do Rio de Janeiro: o Palácio Monroe, a praça Paris, o Theatro Municipal e a praça da Glória.
Nos anos 80, iniciei a catalogação das obras de Edith Blin e, tendo ouvido relatos de pessoas que tinham convivido com o casal Edith e Wambach, resolvi catalogar também a sua obra. Este fato me fez chegar ao projeto de publicação do livro “Aquarelas de Georges Wambach – Impressões do Brasil“, financiado pelo Banco Itaú, que havia adquirido um dos álbuns de aquarelas do pintor. Fui chamada por Margarida Cintra, da editora Marca d’Água, para participar do conteúdo da publicação e fiquei muito feliz em contribuir com tão belo trabalho! Abaixo, duas das obras que constam do livro.
Embora Wambach seja mais conhecido pelas suas aquarelas e bicos de pena, representando paisagens de todo o Brasil, ele também fez muitos retratos e produziu um grande número de obras eróticas. Bem antes de Di Cavalcanti, as mulatas brasileiras já faziam parte de quadros pintados por Wambach. Mas isso é tema para outro post…
Fonte: Arte na Rede, publicado por Catherine Beltrão em 19 de junho de 2014.
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Georges Wambach no ceará
Na parede da sala de dona Lúcia destacava-se uma pintura de seu rosto: jovem, cabelos cacheados, atraíam-nos os seus olhos límpidos, oceânicos, na cor dos nossos mares bravios, olhos argutos e afetuosos. O pintor era bom retratista, de extremo bom gosto e sensibilidade. Dona Lúcia me disse que se tratava de Georges Wambach, um pintor viajante belga que visitara o sítio de Messejana nos anos 1950, e fizera também aquarelas e bicos de pena da paisagem local, com a lagoa, as majestosas árvores e variadas plantas. E ela me mostrou uma paisagem pintada a óleo, com a mesma maestria e requinte do retrato. Wambach, disse dona Lúcia, passava longas horas no meio dos cajueiros, das mangueiras, ou na beira da lagoa de Messejana, diante de seu cavalete, pincel na mão, trabalhando com aquarela ou com tinta a óleo.
Por uma dessas misteriosas coincidências da vida, após essa conversa um gentil leitor me presenteou um livro, Impressões do Brasil, com aquarelas e a curiosa biografia desse pintor viajante. Nascido na Antuérpia, era filho de um importante músico, maestro e compositor; e de uma talentosa pintora de animais e marinhas que passou ao filho as noções iniciais de pintura. Durante a Primeira Grande Guerra a família se refugiou em Londres, temendo a ocupação da Bélgica pelos alemães.
Na volta para a Antuérpia, após o fim da guerra, passando por Bordeaux, o rapaz de 16 anos recebeu de presente de um major general um álbum de autógrafos que o acompanharia por toda a vida. Dona Lúcia chegou a ver esse álbum, quando foi com o marido visitar o atelier do amigo na avenida Niemeyer, no Rio. Havia assinaturas de Napoleão Bonaparte, dos reis da Bélgica, da Inglaterra, da Itália, da Espanha, de políticos como Churchill ou Mussolini, de músicos, como Gounod ou Saint-Saëns, que eram amigos de seu pai. E assinaturas de renomados brasileiros, como Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek; até alguns poemas de Carlos Drummond, manuscritos pelo próprio poeta naquelas páginas que Wambach gostava de mostrar a todos, como uma confirmação de seu espírito amistoso e de sua relevância social.
Riso espontâneo, boêmio, divertido, casou-se muito cedo, e o casamento durou pouco. Após a separação, o rapaz saiu do emprego como contador num banco e dedicou-se à sua arte. Morava então em Bruxelas, onde se apaixonou por uma atriz de teatro, Edith Blin, casada com um diplomata brasileiro que servia na Bélgica. Foi na companhia de Edith que Wambach pisou pela primeira vez o Brasil, em 1935, fugindo do fascismo que, segundo ele, sufocava a vida artística europeia. As cores, luzes, a vegetação tropical, as nossas paisagens, nossos rostos, incendiaram a arte de Wambach. Sua primeira exposição brasileira, em 1942, mostrou impressões de viagens que realizava pelo País, em aviões da FAB. Em 1945 fez sua última exposição; nunca mais conseguiria juntar seus trabalhos, vendidos ou presenteados na medida de suas necessidades de dinheiro ou de relações. Apreciava a vida noturna, a boa mesa, as morenas, e uma boa cerveja gelada. Seu filho relembra que, quando veio ver o pai, Wambach ficou preocupado com o que iam comer, pois na geladeira só havia champanhe e foie gras.
Seu roteiro de viagens é requintado e impressionante. Wambach pintou imagens bucólicas da ilha de Paquetá, do Rio; cenas de Vitória e Anchieta no Espírito Santo; de Manaus, Apuí, Parintins, no Amazonas; Boca do Riozinho no Acre; Belém do Pará; Itapuã, Itaparica, cenas e personagens da Bahia; de Japaratuba em Sergipe; imagens do Maranhão; de Olinda, Fernando de Noronha e Igarassu, em Pernambuco; Sabará, Ouro Preto, Diamantina, Congonhas, Itabira, Belo Horizonte, em Minas. Ilha Bela e São Sebastião, São Paulo. No Ceará, pintou a Casa de José de Alencar, a praça dos Leões, Maranguape, o farol de Mucuripe... O andarilho tinha o cuidado de levar suas obras aos correios de cada cidade, para serem carimbadas, comprovando assim que tinham sido feitas no local.
Dona Lúcia guardava cartas de Wambach, escritas ora em francês, ora num bom português. Vinham de Londres, Paris, em papel timbrado de algum hotel, ou mesmo da Companhia de Navegação Costeira, no Rio; ou da Antuérpia, anunciando que o artista ia para Madri, Gibraltar, Casablanca, ou voltava ao Rio. Um cabograma chegou em inglês, cumprimentando a amiga em seu aniversário, que era em 6 de maio: “Nice sweet and happy birthday to you May every night and day always be spring for you”. Já se foram dona Lúcia, Georges Wambach, e tantos outros seres inesquecíveis. Mas cá estão os retratos, as cartas, os livros, atenuando as saudades em nosso coração.
Fonte: O Povo, por Ana miranda, publicado em 17 de maio de 2015.