Henrique Bernardelli (Valparaíso, Chile, 15 de julho de 1858 — Rio de Janeiro, RJ, 6 de abril de 1936) foi um pintor, desenhista, gravador e professor chileno, radicado na Itália e Brasil. Umas das obras mais emblemáticas do pintor é o retrato de Machado de Assis para a Academia Brasileira de Letras. É irmão do escultor Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e do violonista e pintor Felix Bernadelli (1862-1905).
Biografia - Itaú Cultural
Chega com a família ao Brasil no começo da década de 1860, se estabelecendo no Rio Grande do Sul. Em 1867, transfere-se para o Rio de Janeiro. Três anos depois, matricula-se na Academia Imperial de Belas Artes (Aiba), juntamente com o irmão Rodolfo. É aluno de Zeferino da Costa (1840-1915), Agostinho da Motta (1824-1878) e Victor Meirelles (1832-1903). Viaja para a Itália em 1878. Em Roma, freqüenta o ateliê de Domenico Morelli (1826-1901) com quem estuda até 1886. Volta ao Brasil no mesmo ano, realiza no Rio de Janeiro uma exposição individual que causa interesse e polêmica no meio local. São apresentadas, entre outras obras, Tarantela (1886), Maternidade (1878), Messalina (1880), Modelo em Repouso (ca.1881) e Ao Meio Dia.
Leciona na Escola Nacional de Belas Artes (Enba) de 1891 a 1905, quando não aceita a renovação de seu contrato, alegando que a instituição precisa renovar seus quadros periodicamente. Juntamente com o irmão, passa a lecionar em um ateliê particular, na Rua do Ouvidor, no Rio de Janeiro, onde estudam, entre outros, Lucílio de Albuquerque (1885-1962) e Georgina de Albuquerque (1885-1962), Eugênio Latour (1874-1942), Hélios Seelinger (1878-1965) e Arthur Timótheo da Costa (1822-1922).
Na década de 1890, realiza importantes trabalhos decorativos, como a pintura de painéis para o interior do Theatro Municipal, os painéis O Domínio do Homem sobre as Forças da Natureza e A Luta pela Liberdade, para a Biblioteca Nacional , ambos no Rio de Janeiro, e para o Museu Paulista, em São Paulo. Merecem especial destaque os 22 medalhões em afresco que adornam a fachada do atual edifício do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA), expostos no Salão da Enba de 1916. Em 1931, diversos pintores insatisfeitos com o modelo de ensino da Enba organizam-se coletivamente criando um grupo voltado ao aprimoramento técnico e a reformulação do ensino artístico, dando-lhe o nome de Núcleo Bernardelli em homenagem aos professores Henrique e Rodolfo.
Críticas
"Bernardelli foi o primeiro pintor brasileiro a extrair todos os fundamentos de sua experiência artística dos processos, hábitos técnicos e cores da pintura italiana praticada por muitos artistas do século XIX (...). O sentido do primado conferido à objetividade sem concessões a sentimentalismos a despeito do tema que, em outro pintor, poderia dar margem a divagações psicológicas ou a pieguismos vulgares. A reflexão em torno de temas não era de seu feitio. Suas vivências refletiam e desdobravam-se em suas pinturas sacras ou profanas, ao contato com o modelo real sem maiores compromissos com o transcendental, no primeiro caso, e sentimentalismo no outro. A constituição psicológica e a formação emocional de Bernardelli era a do homem que conferia primado à matéria. Sua consciência e sua arte só tinham compromissos com os efeitos que ele admitia como realidade. E uma realidade sólida e bem estruturada sob a qual, pintando, não empregava recursos de tonalidade tênue, transparências ou reflexos de efeitos ligeiros e fáceis. Aplicava tintas em plena pasta e pinceladas marcadas, acompanhando, o mais das vezes, o movimento das formas representadas e conseguindo dessa forma uma evidente sensação de volume".
Edson Motta e equipe do MNBA (Museu Nacional de Belas Artes. Apresentação Roberto Daniel Martins Parreira; texto Edson Motta. Rio de Janeiro: Funarte, 1979. 196 p. , il. color.)
"(...) após oito anos de estudo em Roma, Henrique Bernardelli (...) impõe-se de pronto e sem despertar polêmica sobre a obra que trazia e a marcante personalidade que demonstrava, a não ser por parte de alguns críticos mais limitados. Estranhavam estes as influências que traziam da pintura italiana do fim do século (...). Sucedia apenas que Henrique Bernardelli escapava àquele semblante do oficialismo artístico de Paris, que conformando tudo o que poderia ser admitido como pintura válida em nosso meio, acabara, por força do hábito, a assemelhar-se a uma condição marcante da criatividade nacional. (...) O que havia de mais particular na obra trazida pelo jovem pintor recém-chegado era o aspecto de uma pintura nova para o que aqui se conhecia. Não exatamente a diferença de um academismo francês em relação a outro italiano, mas principalmente pelo artista desfazer-se de preocupações técnicas e estéticas conservadoras e abrir uma nova visão para a pintura (...). Logo se deixa perceber, nas telas trazidas por Henrique, que muito havia de popular, de tendência a acentuar a naturalidade das coisas, dos fatos, enfim uma visão subordinada às sugestões diretas da natureza, o que exigia desprendimento técnico e capacidade de improvisação para o domínio sobre novos efeitos visuais".
Quirino Campofiorito (História da pintura brasileira no século XIX. Prefácio Carlos Roberto Maciel Levy. Rio de Janeiro: Pinakotheke, 1983. 292 p. , il color)
"Bernardelli é um robusto moço dotado de talento omnímodo e, por hereditariedade, de verdadeiro sentimento artístico. Os seus trabalhos inculcam um temperamento irrequieto, nervoso, sôfrego de impressões, uma dessas organizações atléticas, munidas de espátulas largas, forte peito, músculos desenvolvidos e reforçados pelo higiênico exercício das caminhadas ao ar livre, pelo alto das montanhas. A sua obra é vigorosa, original, cheia de calor, cheia de ousadia. Cheia de ousadia! sim, porque ela é nova, porque ultrapassa os arruinados sistemas da confecção acadêmica, porque faz sentir o caráter essencial do objeto, segundo a expressão de H. Taine; porque comove e é pessoal e é verdadeira. Veja-se um quadro de mestre, qualquer dos 'nossos mestres' e enquanto a obra deste consegue, unicamente, da nossa atenção um qualificativo, algumas vezes destilado pela complacência; a obra daquele nos impressiona, nos desperta alguma emoção nova, nos provoca admiração ou ódio. Eis onde está a superioridade do artista".
Gonzaga Duque (A arte brasileira. Introdução Tadeu Chiarelli. Campinas: Mercado de Letras, 1995. 270 p.)
Prêmios:
1871 - Menção em Desenho de ornatos
1872 - Pequena medalha de ouro em Desenho figurado
1873 - Menção em Desenho figurado
1874 - Grande medalha de ouro em Desenho figurado
1876 - Medalha de prata em Pintura histórica
1877 - Pequena medalha de ouro em Pintura histórica e Pequena medalha de ouro em Modelo vivo
Exposições Individuais
1886 - Rio de Janeiro RJ - Individual, na Enba
Exposições Coletivas
1870 - Rio de Janeiro RJ - 21ª Exposição Geral de Belas Artes, na Aiba
1884 - Rio de Janeiro RJ - 26ª Exposição Geral de Belas Artes, na Aiba - medalha de ouro de 1ª classe
1886 - Rio de Janeiro RJ - Nicolau Facchinetti e Henrique Bernardelli, na Imprensa Nacional
1887 - Rio de Janeiro RJ - Antônio Parreiras, Castagento e Henrique Bernardelli, no Grêmio de Letras e Artes.
1889 - Paris (França) - Exposição Universal - medalha de bronze
1890 - Rio de Janeiro RJ - Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1894 - Rio de Janeiro RJ - 1ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1895 - Rio de Janeiro RJ - 2ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1896 - Rio de Janeiro RJ - 3ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1897 - Rio de Janeiro RJ - 4ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1898 - Rio de Janeiro RJ - 5ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1900 - Rio de Janeiro RJ - 7ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1901 - Rio de Janeiro RJ - 8ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1902 - Rio de Janeiro RJ - 9ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1903 - Rio de Janeiro RJ - 10ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1904 - Rio de Janeiro RJ - 11ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1905 - Rio de Janeiro RJ - 12ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1907 - Rio de Janeiro RJ - 14ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1909 - Rio de Janeiro RJ - 16ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1910 - Rio de Janeiro RJ - 17ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1911 - São Paulo SP - Primeira Exposição Brasileira de Belas Artes, no Liceu de Artes e Ofícios
1916 - Rio de Janeiro RJ - 23ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1927 - Rio de Janeiro RJ - 34ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1928 - Rio de Janeiro RJ - 35ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1929 - Rio de Janeiro RJ - 36ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1930 - Rio de Janeiro RJ - 37ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1931 - Rio de Janeiro RJ - Galeria Irmãos Bernardelli, no Mnba
1931 - Rio de Janeiro RJ - Salão Revolucionário, na Enba
1933 - Rio de Janeiro RJ - 40ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1934 - Rio de Janeiro RJ - 3º Salão do Núcleo Bernardelli, na Enba
1935 - Rio de Janeiro RJ - 4º Salão do Núcleo Bernardelli, na Enba
Exposições Póstumas
1948 - Rio de Janeiro RJ - Retrospectiva da Pintura no Brasil, no Mnba
1950 - Rio de Janeiro RJ - Um Século da Pintura Brasileira: 1850-1950, no Mnba
1970 - São Paulo SP - Pinacoteca do Estado de São Paulo 1970, na Pesp
1976 - São Paulo SP - Henrique Bernardelli: uma coleção de desenhos, na Pesp
1976 - São Paulo SP - O Retrato na Coleção da Pinacoteca, na Pinacoteca do Estado
1980 - São Paulo SP - A Paisagem Brasileira: 1650-1976, no Paço das Artes
1984 - Rio de Janeiro RJ - 7º Salão Nacional de Artes Plásticas - Salão de 31, no Mnba
1984 - São Paulo SP - Tradição e Ruptura: síntese de arte e cultura brasileiras, na Fundação Bienal
1986 - São Paulo SP - Dezenovevinte: uma virada no século, na Pesp
1986 - Rio de Janeiro RJ - Henrique Bernardelli, no MNBA
1986 - Rio de Janeiro RJ - Mostra Comemorativa dos 50 Anos da Sua Morte, no Mnba
1989 - Fortaleza CE - Arte Brasileira dos Séculos XIX e XX nas Coleções Cearenses: pinturas e desenhos, no Espaço Cultural da Unifor
1991 - São Paulo SP - O Desejo na Academia: 1847-1916, na Pesp
1994 - São Paulo SP - Um Olhar Crítico sobre o Acervo do Século XIX, na Pesp
1995 - Rio de Janeiro RJ - Mostra Acervo Caixa Econômica Federal, no Espaço Arte Barrashopping
2000 - São Paulo SP - Brasil + 500 Mostra do Redescobrimento. Arte no Século XIX, na Fundação Bienal
2000 - Porto Alegre RS - De Frans Post a Eliseu Visconti: acervo Museu Nacional de Belas Artes-RJ, no Margs
2001 - São Paulo SP - 30 Mestres da Pintura no Brasil, no Masp
2001 - Rio de Janeiro RJ - Aquarela Brasileira, no Centro Cultural Light
2001 - São Paulo SP - Trajetória da Luz na Arte Brasileira, no Itaú Cultural
2002 - Brasília DF - Barão do Rio Branco: sua obra e seu tempo, no Ministério das Relações Exteriores. Palácio do Itamaraty
2002 - Niterói RJ - Arte Brasileira sobre Papel: séculos XIX e XX, no Solar do Jambeiro
2002 - São Paulo SP - Imagem e Identidade: um olhar sobre a história na coleção do Museu de Belas Artes, no Instituto Cultural Banco Santos
Fonte: HENRIQUE Bernardelli. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 19 de Jul. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
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Vida e obra - Wikipédia
Henrique Bernardelli nasceu em Valparaíso, no Chile, em 1858 e se mudou com seus pais e irmãos - o escultor Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e o violonista e pintor Felix Bernardelli (1862-1905) - para o Rio Grande do Sul, no Brasil, no começo da década de 1860. A família transfere-se para o Rio de Janeiro em 1867. Em 1870 matriculou-se, juntamente com o irmão Rodolfo, na Academia Imperial de Belas Artes, estudando com pintores de destacada importância, como Victor Meireles e Agostinho José da Mota. Henrique torna-se aluno de Zeferino da Costa (1840-1915), Agostinho da Motta (1824-1878) e Victor Meirelles (1832-1903).
Em 1878 naturalizou-se brasileiro para poder concorrer ao Prêmio de Viagem à Europa concedido pela AIBA. Após perder o prêmio para Rodolfo Amoedo, viajou para Roma, em 1878, com recursos próprios. Em Roma, estuda e frequenta o ateliê de Domenico Morelli (1826-1901), entrando em contato com as obras de artistas como Francesco Paolo Michetti e Giovanni Segantini.
Ao retornar ao Rio de Janeiro, em 1888, Henrique realiza uma série de exposições individuais como a Exposição Universal de Paris, ganhando medalha de bronze com a tela Os Bandeirantes; em 1890, da Exposição Geral das Belas Artes, onde destaca-se com obras como Dicteriade, Tarantella e Calle de Venezia; e em 1893, da Exposição Universal de Chicago, com Messalina, Mater e Proclamação da República. É neste momento que as obras Tarantela (1886), Maternidade (1878), Messalina (1880), Modelo em Repouso (ca.1881) e Ao Meio Dia são apresentadas ao público.
Em 1891 tornou-se professor de pintura na recém-inaugurada Escola Nacional de Belas Artes e encerra seu contrato em 1905. Henrique deixa de lecionar na faculdade alegando que a instituição precisa renovar seus quadros periodicamente. Ele e seu irmão Rodolfo passam a lecionar em um ateliê particular no Rio de Janeiro. Lucílio de Albuquerque (1885-1962) e Georgina de Albuquerque (1885-1962), Eugênio Latour (1874-1942), Hélios Seelinger (1878-1965) e Arthur Timótheo da Costa (1822-1922) são um dos seus principais alunos de destaque.
O artista manteve vivo o contato com a cultura figurativa italiana, viajando constantemente para cidades como Roma, Nápoles e Veneza. Lecionou na Escola até ser substituído por Eliseu Visconti, em 1906, passando então a dar aulas particulares em seu ateliê, recebendo concomitantemente encomendas particulares.
Em 1916, conquistou uma das mais altas premiações que um artista plástico pode aspirar no Brasil: a medalha de honra. Foi também membro do Conselho Superior de Belas Artes, para o qual prestou relevantes serviços.
Grande parte da obra de Henrique Bernardelli foi doada à Pinacoteca do Estado conforme mostra o seu último catálogo.
Vê-se uma herma sua na Praça do Lido, em Copacabana, obra do escultor Leão Veloso.
Em 1931, o Núcleo Bernardelli, em homenagem aos professores Henrique e Rodolfo, foi criado por diversos pintores insatisfeitos com o modelo de ensino da Enba que buscavam criar um grupo voltado ao aprimoramento técnico e a reformulação do ensino artístico.
Retrato de Machado de Assis
Em 1905, Henrique Bernardelli pintou o retrato a óleo oficial do escritor brasileiro Machado de Assis, transformando a obra em uma iconografia machadiana. A tela, segundo historiadores, foi uma encomenda para decorar uma sala da Academia Brasileira de Letras, tendo assim efeito publicitário - caracterizando o retrato pelo sua austeridade e impecabilidade mobiliária e roupa sofisticada. Henrique pinta Machado de postura firme, acentuando a linguagem clássica da pintura. O Doutor em Literatura, Victor da Rosa, traduz a ideia que o retrato procura passar da seguinte forma:
“ Dessa vez Machado aparece não mais como o escritor em ascensão (...) e sim como um verdadeiro burocrata das letras, canonizado pelas instituições, alguém que subiu todos os degraus possíveis no processo de legitimação dentro do sistema literário. ”
Atualmente, o retrato ainda localiza-se na sala da Academia brasileira de Letras, junto com o busco de bronze de Machado, feito pelo escultor Jean Magrou.
Henrique Bernardelli e o Museu Paulista
Com o centenário da independência do Brasil (1922), o historiador Afonso d'Escragnolle Taunay, então diretor do Museu Paulista, aproveitou a data comemorativa para colocar em prática um projeto voltado à memória da nacional. Taunay elaborou a organização de oito salas voltas a memória paulista de forma linear e evolutiva. Para isso, o diretor convidou alguns pintores, sendo Henrique Bernardelli um dos convidados mais ilustres. Em 1921, Bernardelli e Rodolpho Amoedo, ambos com sessenta e quatro anos, foram convidados - já que pertenciam a Escola Nacional de Belas Artes (Anba) no Rio de Janeiro. Na época, Henrique não lecionava mais na Anba, mas recebia encomendas oficiais, como o retrato do presidente Epitácio Pessoa, feito no mesmo ano.
A primeira versão do quadro O Ciclo de Caça ao Índio foi rejeitada por Taunay pelo cachorro que acompanhava o bandeirante e o chicote de couro em sua mão. Tais objetos poderiam desvalorizar a imagem do bandeirante, o que não correspondia com a imagem heroica que o diretor queria transmitir. Para Maraliz de Castro Vieira Christo, Doutora em História pela UNICAP, Henrique Bernardelli entrou em um conflito ter que retratar o bandeirante como herói sem mostra-lo como um algoz caçar do índio, tendo em vista a simbologia do mesmo que a partir da metade do século XIX passou a ser visto como "simbolo nacional, não podendo ter sua imagem associada ao canibalismo e à barbárie, que, antes, justificava a sua caça e seu aprisionamento".
A solução, segundo a Doutora, foi minimizar o enfoque relativo a escravidão indígena, deslocando a atenção para o sofrimento do homem branco no processo "civilizador". Assim, encontramos uma humanização do bandeirante e o retratando como um ser predominantemente vencido pela natureza (contrapondo-se ao projeto do Museu Paulista).
Obras Decorativas
Henrique também é responsável por importantes trabalhos decorativos, tanto em São Paulo como no Rio de Janeiro.
Os painéis O Domínio do Homem sobre as Forças da Natureza e A Luta pela Liberdade, para a Biblioteca Nacional e o teto de uma das salas do Theatro Municipal (1908), ambos no Rio de janeiro, são referência da pintura brasileira do século XX. O edifício do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA) também teve a obra de Henrique em 22 medalhões em afresco que adornam sua fachada.
Análise
O trabalho de Henrique Bernardelli marcou a história da arte brasileira e influenciou dezenas de pintores do século XX como, Manoel Santiago, Bustamante Sá, Bruno Lechowski entre outros.
Fonte: Wikipédia, consultado pela última vez em 23 de janeiro de 2020.
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Henrique Bernardelli, por José Roberto Teixeira Leite
“Os defeitos de Bernardelli foram qualidades. Um revolucionário, um inovador, não pode ser um frio desenhador da linha, nem um colorista preciso. É necessário que ele seja diferente, que seja resoluto, que pinte o que sente sem artifícios antigos, mas por artifícios modernos, porque, afinal de contas, o estilo não é mais do que um artifício empregado para exprimir as nossas emoções”.
A incompreensão de crítica e público em face da mostra de 1886 parece ter arrefecido o ímpeto do jovem artista que, a partir de então, e apesar de poucas obras notáveis, tornou-se mais cauteloso e conservador. Perderia algo daquela "maneira sólida, segura e franca" dos quadros realizados na Itália, adotando um estilo mais convencional, que por volta de 1908 chegara ao esgotamento e à conseqüente repetição: já no Salão de 1904, os retratos de Machado de Assis e Ubaldino do Amaral que expõe, merecem de Gonzaga Duque o reparo de que foram "pintados por mão de mestre, mas, não sei porque, temperados com chocolate".
Na verdade, como tantos de nossos melhores pintores de seu tempo, Henrique Bernardelli teve de seguir as duas únicas opções que se abriam a um artista brasileiro: lecionar, ou executar retratos e encomendas oficiais. Foi o que fez, dobrando-se, assim, ao gosto tradicional. De 1891 a 1905, lecionou na Escola Nacional de Belas Artes. Homem de probidade e de idéias arejadas, não aceitou que seu contrato fosse renovado naquele último ano, alegando que aos alunos devem ser oferecidos, de tempos em tempos, novos professores, para que o ensino não se torne esclerosado! Passou a ensinar pintura em sua propria residência em Copacabana, por onde passaram, entre inúmeros outros, Lucílio e Georgina de Albuquerque, Eugênio Latour, Helios Seelinger e Artur Timóteo da Costa. Prova concreta de quanto eram prezados pelos jovens artistas os dois Bernardelli, Rodolfo e Henrique, deu-se em 1931, quando um grupo de alunos da Escola Nacional de Belas Artes criou um ateliê livre de pintura, nos porões da instituição, batizando-o com o nome de Núcleo Bernardelli.
Pintor decorativista, Bernardelli fez painéis para o Teatro Municipal, para a Biblioteca Nacional, para o Cinema Pathé-Palácio; trabalhou ainda para o Museu Paulista. Mas suas obras mais importantes, no gênero, são os 22 medalhões em afresco que ornam a fachada do atual prédio do Museu Nacional de Belas Artes, na Avenida Rio Branco, expostos em 1916 no Salão e que lhe valeram a medalha de honra.
Bernardelli teve defensores entusiásticos, mesmo no ocaso da sua carreira. Assim, Angione Costa dele fala, em A inquietação das abelhas, de 1927:
“Henrique Bernardelli é um pintor que, na segunda metade da vida, sem marcar uma evolução acentuada, consegue entretanto, pintar belos quadros, nos quais o colorido é uma maravilha, e o seu pincelar seguro, um prodígio de concisão”.
Exagero sem dúvida, porquanto, após os 50 anos, Bernardelli aquietara-se, perdera os ferrões da mocidade, academizara-se em suma. O que doravante iria perpassar em sua produção seriam ecos do que anteriormente fizera, produtos concebidos e executados mecanicamente e sem emoção; nem mais aqueles "temas helênicos, influência da dança antiga, raras ressonâncias simbolistas", ou os modismos estilísticos Belle Époque que lhe surpreendeu Mário Barata; mas as composições do tipo A saúde da bela!, de um rococó anacrônico e anêmico, chupado em Fragonard e em outros artistas franceses do séc. XVIII e mesmo do séc. XIX. A que distância está-se, já agora, de Messalina, ou dos Bandeirantes!.
Henrique Bernardelli foi pintor de história e de gênero, retratista e paisagista. Praticou diversas técnicas - o óleo, a têmpera, o fresco, o pastel, a aquarela, a água-forte. Sua produção encontra-se distribuída principalmente entre o Museu Nacional de Belas Artes (120 obras de diferentes épocas e técnicas) e a Pinacoteca do Estado de São Paulo (344 desenhos, 41 aquarelas e ainda óleos). Maternidade, Tarantela, Bandeirantes, Proclamação da República são seus quadros mais conhecidos, mas não forçosamente os melhores, pois o verdadeiro Bernardelli revela-se em detalhes, aqui na vibração de uma nota de cor, ali na elegância de um arabesco ou num trecho de fatura surpreendentemente moderna, feito mediante um pincelar ágil e seguro.
José Roberto Teixeira Leite (Extraído do livro Dicionário crítico da pintura no Brasil, ArtLivre, Rio de Janeiro, 1988)
Fonte: Artedata, publicado por Carlos Roberto Maciel Levy, crítico e Historiador de arte, texto original de
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Henrique Bernardelli
Parece que era coisa de destino, o menino Henrique Bernardelli ter se tornado um artista. Tinha nas veias uma herança difícil de evitar, pois era filho de pai violinista russo e uma mãe bailarina francesa. Nasceu no Chile, mais precisamente a 15 de julho de 1857 e faleceu no Rio de Janeiro, a 6 de abril de 1936. Os pais vieram para o Rio Grande do Sul, bem no início dos anos de 1860, radicando por lá. Isso após terem feito um longo trajeto do México até o Chile. A ida para o Rio de Janeiro foi um convite feito por D. Pedro II, em 1865, quando conheceu os Bernardelli em Porto Alegre. A ida da família se deu em 1867.
Henrique Bernardelli encontrou um terreno fértil para os estudos. Matriculou-se na Academia Imperial de Belas-Artes, onde cursou até 1878. Teve como mestres ninguém menos que Zeferino da Costa, Vítor Meireles e Agostinho da Mota. Durante o curso, expôs várias vezes e em diversas delas recebeu importantes condecorações. Porém, não conseguiu o prêmio de Viagem à Europa, que o Imperador fornecia ao artista vencedor de cada salão. Foi derrotado nessa disputa por Rodolfo Amoedo. Um tanto quanto frustrado com o acontecido, decide ir para a Itália, por conta própria, a fim de polir seus estudos. Radicando-se em Roma, torna-se aluno de Domenico Morelli.
Da produção que fez na Itália, voltou um artista mais seguro, com um estilo próprio e uma certa firmeza no traço, bem diferente do que se fazia por aqui. Talvez por isso, sua exposição individual, realizada em 1886, não conquistou o gosto do público, mesmo exibindo obras que hoje são consagradas, como Tarantela, Maternidade, Messalina, Modelo em Repouso e Ao meio dia. Depois do ocorrido, tornou-se um artista mais conservador e cauteloso, perdendo um pouco da solidez adquirida na Itália e adotando um estilo mais convencional, que comprometeria um pouco sua carreira, a partir de 1908. A escolha por um estilo mais discreto e tradicional não era o que exatamente queria o artista. Como muitos grandes artistas de seu tempo, Bernardelli precisou seguir as duas únicas opções dispostas a quem viesse a produzir arte: lecionar, ou executar retratos e encomendas oficiais. E foi o que fez!
Entre os anos de 1891 e 1905, lecionou na Escola Nacional de Belas-Artes, rompendo o contrato com a escola quando viu que já não era mais possível continuar com os mesmos métodos de ensino. Passa, então, a lecionar em sua própria residência, em Copacabana, onde recebe diversos alunos, vindo a destacar entre eles, Lucílio e Georgina de Albuquerque, Eugênio Latour, Hélios Seelinger e Artur Timóteo da Costa. Os irmãos Rodolfo e Henrique Bernardelli eram muito queridos de seus discípulos, prova disso é que, em 1931, um grupo de alunos da Escola Nacional de Belas-Artes criou um ateliê livre de pintura, nos porões da instituição e deram a ele o nome de Núcleo Bernardelli.
Bernardelli era um artista versátil e tornou-se um pintor decorativista, por excelência. Realizou painéis para o Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional e para o Cine Pathé. Realizou também algumas obras para o Museu Paulista. Mas, no gênero decorativo, suas obras mais importantes são os 22 medalhões em afresco, que ornamentam a fachada do Museu Nacional de Belas-Artes, na Avenida Rio Branco. Obras que lhe valeram a Medalha de Honra, no salão de 1916.
O Museu Nacional de Belas-Artes possui 120 obras suas, de diferentes épocas e técnicas. Na Pinacoteca do Estado de São Paulo estão mais diversos trabalhos, cerca de 344 desenhos, 41 aquarelas e vários óleos. Em suma, era bem eclético. Foi um pintor de história e de gênero, retratista e paisagista. Utilizou diversas técnicas: óleo, têmpera, afresco, pastel, aquarela e água-forte.
Fonte: Jose Rosário Art, publicado por Jose Rosário em 7 de julho de 2012.
Crédito fotográfico: Jose Rosário Art, Henrique Bernardelli em foto de 1933.
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Núcleo Bernardelli
Fundado em 12 de junho de 1931 por um conjunto de pintores comprometidos com a oposição ao modelo de ensino da Escola Nacional de Belas Artes - Enba, o Núcleo Bernadelli possui como metas centrais a formação, o aprimoramento técnico e a profissionalização artísticos. "Queríamos liberdade de pesquisa e uma reformulação do ensino artístico da Escola Nacional de Belas Artes, reduto de professores reacionários, infensos às conquistas trazidas pelos modernos", afirma Edson Motta (1910 - 1981), um dos líderes do grupo. Além de democratizar o ensino, o grupo almeja permitir o acesso dos artistas modernos ao Salão Nacional de Belas Artes e aos prêmios de viagens ao exterior, dominados pelos pintores acadêmicos. O nome do grupo é uma homenagem clara a dois professores da Enba, Rodolfo Bernardelli (1852 - 1931) e Henrique Bernardelli (1858 - 1936), que no final do século XIX, insatisfeitos com o ensino da escola, mas também movidos por interesses políticos-administrativos, montam um curso paralelo na Rua do Ouvidor, no centro da cidade do Rio de Janeiro. O Núcleo Bernardelli funciona primeiramente no Studio Nicolas, do fotógrafo Nicolas Alagemovits, e muda-se em seguida para os porões da Enba, onde funciona até 1936. Nessa data, transfere-se para a Rua São José, depois para a Praça Tiradentes, n. 85, até a sua extinção em 1941. Participam do também denominado "ateliê livre", os pintores: Ado Malagoli (1906 - 1994), Bráulio Poiava (1911), Bustamante Sá (1907 - 1988), Bruno Lechowski (1887 - 1941), Sigaud (1899 - 1979), Camargo Freire (1908 - 1988), Joaquim Tenreiro (1906 - 1992), Quirino Campofiorito (1902 - 1993), Rescála (1910 - 1986), José Gomez Correia, José Pancetti (1902 - 1958), Milton Dacosta (1915 - 1988), Manoel Santiago (1897 - 1987), Yoshiya Takaoka (1909 - 1978) e Tamaki (1916 - 1979).
A criação do Núcleo Bernadelli remete a um contexto artístico, dos anos 1930 e 1940, atravessado por tentativas de ampliação dos espaços da arte e dos artistas modernos, por meio da criação de grupos e associações. A Pró-Arte Sociedade de Artes, Letras e Ciências (1931) e o Club de Cultura Moderna (1935), no Rio de Janeiro, ao lado de agremiações paulistanas como Clube dos Artistas Modernos - CAM, a Sociedade Pró - Arte Moderna - SPAM, ambos de 1932, o Grupo Santa Helena (1934) e a Família Artística Paulista - FAP (1937) são expressões do êxito do associativismo como estratégia de atuação dos artistas na vida cultural do país na época. Cada qual à sua maneira, esses grupos problematizam o legado do modernismo. Um outro esforço de modernização do ensino artístico pode ser localizado na tentativa de reforma da Enba, empreendida por Lúcio Costa (1902 - 1998) ao assumir a direção da escola, em 12 de dezembro de 1930.
Se o Núcleo Bernadelli é concebido em consonância com os projetos modernos em gestação e desenvolvimento, seu funcionamento parece mais voltado para uma tentativa de ocupação de espaço profissional do que de reformulação da linguagem artística. Trata-se fundamentalmente de incentivar o estudo e a formação pela criação de um lugar para convivência, troca de idéias e aprendizado. Desenho com modelos vivos, pintura ao ar livre, nus, naturezas-mortas, retratos e auto-retratos são realizados no ateliê, que promove também exposições das obras. Entre 1932 e 1941 são realizados cinco salões dos integrantes do Núcleo Bernadelli. Além disso, em 1933, o conjunto dessas obras é exposto no Studio Eros Volúsia e, em 1934, em mostra promovida pela Sociedade Brasileira de Belas Artes. Além das paisagens, amplamente realizadas, os artistas do grupo pintam cenas urbanas e figuras humanas. Alguns críticos sublinham a inspiração impressionista desse paisagismo, além da influência construtiva de Paul Cézanne (1839-1906), sobretudo nas naturezas-mortas de Milton Dacosta. Mas é possível localizar em parte da produção do grupo - em Malagoli, por exemplo - afinidades com o ideário do retorno à ordem. Alguns trabalhos de Malagoli, Sigaud e Campofiorito, por sua vez, anunciam questões sociais, em pauta nas manifestações artísticas da década de 1930.
Os nomes de José Pancetti e Milton Dacosta, egressos do grupo, destacam-se posteriormente em função das marcas inovadoras e pessoais dos seus trabalhos. Pancetti se notabiliza pelas marinhas que realiza, além dos diversos retratos e auto-retratos. Os anos de 1950, considerados o ápice de sua produção, conhecem as célebres Lavadeiras na Lagoa do Abaeté, as paisagens de Saquarema e cenas de Mangaratiba. Atento, desde o início de sua obra, aos desafios da composição e ao uso da cor, seus trabalhos dos anos de 1950 enfatizam a organização dos planos geométricos, fazendo com que beirem a abstracão. Milton Dacosta, responsável por uma obra convencionalmente dividida em fases em função das influências que recebe - Paul Cézanne, De Chirico (1888 - 1978), Pablo Picasso (1881 - 1973) e Giorgio Morandi (1890 - 1964) -, esteve sempre preocupado com a esquematização das formas, e recusa mesmo em suas obras figurativas dos anos 1930, qualquer inclinação naturalista mais direta. As lições construtivas, as deformações picassianas e cubistas, o equilíbrio entre planos colorísticos são todas preocupações precoces de seu trabalho (vide Paisagem de Santa Teresa, 1937), indica Mário Pedrosa (1900 - 1981). Por essa razão, o crítico defende que o abstrato é "o ponto de partida do pintor", e não apenas a marca de sua obra após a década de 1950.
Fonte: NÚCLEO Bernardelli (Rio de Janeiro, RJ). In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 19 de Jul. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
Henrique Bernardelli (Valparaíso, Chile, 15 de julho de 1858 — Rio de Janeiro, RJ, 6 de abril de 1936) foi um pintor, desenhista, gravador e professor chileno, radicado na Itália e Brasil. Umas das obras mais emblemáticas do pintor é o retrato de Machado de Assis para a Academia Brasileira de Letras. É irmão do escultor Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e do violonista e pintor Felix Bernadelli (1862-1905).
Biografia - Itaú Cultural
Chega com a família ao Brasil no começo da década de 1860, se estabelecendo no Rio Grande do Sul. Em 1867, transfere-se para o Rio de Janeiro. Três anos depois, matricula-se na Academia Imperial de Belas Artes (Aiba), juntamente com o irmão Rodolfo. É aluno de Zeferino da Costa (1840-1915), Agostinho da Motta (1824-1878) e Victor Meirelles (1832-1903). Viaja para a Itália em 1878. Em Roma, freqüenta o ateliê de Domenico Morelli (1826-1901) com quem estuda até 1886. Volta ao Brasil no mesmo ano, realiza no Rio de Janeiro uma exposição individual que causa interesse e polêmica no meio local. São apresentadas, entre outras obras, Tarantela (1886), Maternidade (1878), Messalina (1880), Modelo em Repouso (ca.1881) e Ao Meio Dia.
Leciona na Escola Nacional de Belas Artes (Enba) de 1891 a 1905, quando não aceita a renovação de seu contrato, alegando que a instituição precisa renovar seus quadros periodicamente. Juntamente com o irmão, passa a lecionar em um ateliê particular, na Rua do Ouvidor, no Rio de Janeiro, onde estudam, entre outros, Lucílio de Albuquerque (1885-1962) e Georgina de Albuquerque (1885-1962), Eugênio Latour (1874-1942), Hélios Seelinger (1878-1965) e Arthur Timótheo da Costa (1822-1922).
Na década de 1890, realiza importantes trabalhos decorativos, como a pintura de painéis para o interior do Theatro Municipal, os painéis O Domínio do Homem sobre as Forças da Natureza e A Luta pela Liberdade, para a Biblioteca Nacional , ambos no Rio de Janeiro, e para o Museu Paulista, em São Paulo. Merecem especial destaque os 22 medalhões em afresco que adornam a fachada do atual edifício do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA), expostos no Salão da Enba de 1916. Em 1931, diversos pintores insatisfeitos com o modelo de ensino da Enba organizam-se coletivamente criando um grupo voltado ao aprimoramento técnico e a reformulação do ensino artístico, dando-lhe o nome de Núcleo Bernardelli em homenagem aos professores Henrique e Rodolfo.
Críticas
"Bernardelli foi o primeiro pintor brasileiro a extrair todos os fundamentos de sua experiência artística dos processos, hábitos técnicos e cores da pintura italiana praticada por muitos artistas do século XIX (...). O sentido do primado conferido à objetividade sem concessões a sentimentalismos a despeito do tema que, em outro pintor, poderia dar margem a divagações psicológicas ou a pieguismos vulgares. A reflexão em torno de temas não era de seu feitio. Suas vivências refletiam e desdobravam-se em suas pinturas sacras ou profanas, ao contato com o modelo real sem maiores compromissos com o transcendental, no primeiro caso, e sentimentalismo no outro. A constituição psicológica e a formação emocional de Bernardelli era a do homem que conferia primado à matéria. Sua consciência e sua arte só tinham compromissos com os efeitos que ele admitia como realidade. E uma realidade sólida e bem estruturada sob a qual, pintando, não empregava recursos de tonalidade tênue, transparências ou reflexos de efeitos ligeiros e fáceis. Aplicava tintas em plena pasta e pinceladas marcadas, acompanhando, o mais das vezes, o movimento das formas representadas e conseguindo dessa forma uma evidente sensação de volume".
Edson Motta e equipe do MNBA (Museu Nacional de Belas Artes. Apresentação Roberto Daniel Martins Parreira; texto Edson Motta. Rio de Janeiro: Funarte, 1979. 196 p. , il. color.)
"(...) após oito anos de estudo em Roma, Henrique Bernardelli (...) impõe-se de pronto e sem despertar polêmica sobre a obra que trazia e a marcante personalidade que demonstrava, a não ser por parte de alguns críticos mais limitados. Estranhavam estes as influências que traziam da pintura italiana do fim do século (...). Sucedia apenas que Henrique Bernardelli escapava àquele semblante do oficialismo artístico de Paris, que conformando tudo o que poderia ser admitido como pintura válida em nosso meio, acabara, por força do hábito, a assemelhar-se a uma condição marcante da criatividade nacional. (...) O que havia de mais particular na obra trazida pelo jovem pintor recém-chegado era o aspecto de uma pintura nova para o que aqui se conhecia. Não exatamente a diferença de um academismo francês em relação a outro italiano, mas principalmente pelo artista desfazer-se de preocupações técnicas e estéticas conservadoras e abrir uma nova visão para a pintura (...). Logo se deixa perceber, nas telas trazidas por Henrique, que muito havia de popular, de tendência a acentuar a naturalidade das coisas, dos fatos, enfim uma visão subordinada às sugestões diretas da natureza, o que exigia desprendimento técnico e capacidade de improvisação para o domínio sobre novos efeitos visuais".
Quirino Campofiorito (História da pintura brasileira no século XIX. Prefácio Carlos Roberto Maciel Levy. Rio de Janeiro: Pinakotheke, 1983. 292 p. , il color)
"Bernardelli é um robusto moço dotado de talento omnímodo e, por hereditariedade, de verdadeiro sentimento artístico. Os seus trabalhos inculcam um temperamento irrequieto, nervoso, sôfrego de impressões, uma dessas organizações atléticas, munidas de espátulas largas, forte peito, músculos desenvolvidos e reforçados pelo higiênico exercício das caminhadas ao ar livre, pelo alto das montanhas. A sua obra é vigorosa, original, cheia de calor, cheia de ousadia. Cheia de ousadia! sim, porque ela é nova, porque ultrapassa os arruinados sistemas da confecção acadêmica, porque faz sentir o caráter essencial do objeto, segundo a expressão de H. Taine; porque comove e é pessoal e é verdadeira. Veja-se um quadro de mestre, qualquer dos 'nossos mestres' e enquanto a obra deste consegue, unicamente, da nossa atenção um qualificativo, algumas vezes destilado pela complacência; a obra daquele nos impressiona, nos desperta alguma emoção nova, nos provoca admiração ou ódio. Eis onde está a superioridade do artista".
Gonzaga Duque (A arte brasileira. Introdução Tadeu Chiarelli. Campinas: Mercado de Letras, 1995. 270 p.)
Prêmios:
1871 - Menção em Desenho de ornatos
1872 - Pequena medalha de ouro em Desenho figurado
1873 - Menção em Desenho figurado
1874 - Grande medalha de ouro em Desenho figurado
1876 - Medalha de prata em Pintura histórica
1877 - Pequena medalha de ouro em Pintura histórica e Pequena medalha de ouro em Modelo vivo
Exposições Individuais
1886 - Rio de Janeiro RJ - Individual, na Enba
Exposições Coletivas
1870 - Rio de Janeiro RJ - 21ª Exposição Geral de Belas Artes, na Aiba
1884 - Rio de Janeiro RJ - 26ª Exposição Geral de Belas Artes, na Aiba - medalha de ouro de 1ª classe
1886 - Rio de Janeiro RJ - Nicolau Facchinetti e Henrique Bernardelli, na Imprensa Nacional
1887 - Rio de Janeiro RJ - Antônio Parreiras, Castagento e Henrique Bernardelli, no Grêmio de Letras e Artes.
1889 - Paris (França) - Exposição Universal - medalha de bronze
1890 - Rio de Janeiro RJ - Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1894 - Rio de Janeiro RJ - 1ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1895 - Rio de Janeiro RJ - 2ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1896 - Rio de Janeiro RJ - 3ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1897 - Rio de Janeiro RJ - 4ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1898 - Rio de Janeiro RJ - 5ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1900 - Rio de Janeiro RJ - 7ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1901 - Rio de Janeiro RJ - 8ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1902 - Rio de Janeiro RJ - 9ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1903 - Rio de Janeiro RJ - 10ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1904 - Rio de Janeiro RJ - 11ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1905 - Rio de Janeiro RJ - 12ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1907 - Rio de Janeiro RJ - 14ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1909 - Rio de Janeiro RJ - 16ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1910 - Rio de Janeiro RJ - 17ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1911 - São Paulo SP - Primeira Exposição Brasileira de Belas Artes, no Liceu de Artes e Ofícios
1916 - Rio de Janeiro RJ - 23ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1927 - Rio de Janeiro RJ - 34ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1928 - Rio de Janeiro RJ - 35ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1929 - Rio de Janeiro RJ - 36ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1930 - Rio de Janeiro RJ - 37ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1931 - Rio de Janeiro RJ - Galeria Irmãos Bernardelli, no Mnba
1931 - Rio de Janeiro RJ - Salão Revolucionário, na Enba
1933 - Rio de Janeiro RJ - 40ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1934 - Rio de Janeiro RJ - 3º Salão do Núcleo Bernardelli, na Enba
1935 - Rio de Janeiro RJ - 4º Salão do Núcleo Bernardelli, na Enba
Exposições Póstumas
1948 - Rio de Janeiro RJ - Retrospectiva da Pintura no Brasil, no Mnba
1950 - Rio de Janeiro RJ - Um Século da Pintura Brasileira: 1850-1950, no Mnba
1970 - São Paulo SP - Pinacoteca do Estado de São Paulo 1970, na Pesp
1976 - São Paulo SP - Henrique Bernardelli: uma coleção de desenhos, na Pesp
1976 - São Paulo SP - O Retrato na Coleção da Pinacoteca, na Pinacoteca do Estado
1980 - São Paulo SP - A Paisagem Brasileira: 1650-1976, no Paço das Artes
1984 - Rio de Janeiro RJ - 7º Salão Nacional de Artes Plásticas - Salão de 31, no Mnba
1984 - São Paulo SP - Tradição e Ruptura: síntese de arte e cultura brasileiras, na Fundação Bienal
1986 - São Paulo SP - Dezenovevinte: uma virada no século, na Pesp
1986 - Rio de Janeiro RJ - Henrique Bernardelli, no MNBA
1986 - Rio de Janeiro RJ - Mostra Comemorativa dos 50 Anos da Sua Morte, no Mnba
1989 - Fortaleza CE - Arte Brasileira dos Séculos XIX e XX nas Coleções Cearenses: pinturas e desenhos, no Espaço Cultural da Unifor
1991 - São Paulo SP - O Desejo na Academia: 1847-1916, na Pesp
1994 - São Paulo SP - Um Olhar Crítico sobre o Acervo do Século XIX, na Pesp
1995 - Rio de Janeiro RJ - Mostra Acervo Caixa Econômica Federal, no Espaço Arte Barrashopping
2000 - São Paulo SP - Brasil + 500 Mostra do Redescobrimento. Arte no Século XIX, na Fundação Bienal
2000 - Porto Alegre RS - De Frans Post a Eliseu Visconti: acervo Museu Nacional de Belas Artes-RJ, no Margs
2001 - São Paulo SP - 30 Mestres da Pintura no Brasil, no Masp
2001 - Rio de Janeiro RJ - Aquarela Brasileira, no Centro Cultural Light
2001 - São Paulo SP - Trajetória da Luz na Arte Brasileira, no Itaú Cultural
2002 - Brasília DF - Barão do Rio Branco: sua obra e seu tempo, no Ministério das Relações Exteriores. Palácio do Itamaraty
2002 - Niterói RJ - Arte Brasileira sobre Papel: séculos XIX e XX, no Solar do Jambeiro
2002 - São Paulo SP - Imagem e Identidade: um olhar sobre a história na coleção do Museu de Belas Artes, no Instituto Cultural Banco Santos
Fonte: HENRIQUE Bernardelli. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 19 de Jul. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
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Vida e obra - Wikipédia
Henrique Bernardelli nasceu em Valparaíso, no Chile, em 1858 e se mudou com seus pais e irmãos - o escultor Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e o violonista e pintor Felix Bernardelli (1862-1905) - para o Rio Grande do Sul, no Brasil, no começo da década de 1860. A família transfere-se para o Rio de Janeiro em 1867. Em 1870 matriculou-se, juntamente com o irmão Rodolfo, na Academia Imperial de Belas Artes, estudando com pintores de destacada importância, como Victor Meireles e Agostinho José da Mota. Henrique torna-se aluno de Zeferino da Costa (1840-1915), Agostinho da Motta (1824-1878) e Victor Meirelles (1832-1903).
Em 1878 naturalizou-se brasileiro para poder concorrer ao Prêmio de Viagem à Europa concedido pela AIBA. Após perder o prêmio para Rodolfo Amoedo, viajou para Roma, em 1878, com recursos próprios. Em Roma, estuda e frequenta o ateliê de Domenico Morelli (1826-1901), entrando em contato com as obras de artistas como Francesco Paolo Michetti e Giovanni Segantini.
Ao retornar ao Rio de Janeiro, em 1888, Henrique realiza uma série de exposições individuais como a Exposição Universal de Paris, ganhando medalha de bronze com a tela Os Bandeirantes; em 1890, da Exposição Geral das Belas Artes, onde destaca-se com obras como Dicteriade, Tarantella e Calle de Venezia; e em 1893, da Exposição Universal de Chicago, com Messalina, Mater e Proclamação da República. É neste momento que as obras Tarantela (1886), Maternidade (1878), Messalina (1880), Modelo em Repouso (ca.1881) e Ao Meio Dia são apresentadas ao público.
Em 1891 tornou-se professor de pintura na recém-inaugurada Escola Nacional de Belas Artes e encerra seu contrato em 1905. Henrique deixa de lecionar na faculdade alegando que a instituição precisa renovar seus quadros periodicamente. Ele e seu irmão Rodolfo passam a lecionar em um ateliê particular no Rio de Janeiro. Lucílio de Albuquerque (1885-1962) e Georgina de Albuquerque (1885-1962), Eugênio Latour (1874-1942), Hélios Seelinger (1878-1965) e Arthur Timótheo da Costa (1822-1922) são um dos seus principais alunos de destaque.
O artista manteve vivo o contato com a cultura figurativa italiana, viajando constantemente para cidades como Roma, Nápoles e Veneza. Lecionou na Escola até ser substituído por Eliseu Visconti, em 1906, passando então a dar aulas particulares em seu ateliê, recebendo concomitantemente encomendas particulares.
Em 1916, conquistou uma das mais altas premiações que um artista plástico pode aspirar no Brasil: a medalha de honra. Foi também membro do Conselho Superior de Belas Artes, para o qual prestou relevantes serviços.
Grande parte da obra de Henrique Bernardelli foi doada à Pinacoteca do Estado conforme mostra o seu último catálogo.
Vê-se uma herma sua na Praça do Lido, em Copacabana, obra do escultor Leão Veloso.
Em 1931, o Núcleo Bernardelli, em homenagem aos professores Henrique e Rodolfo, foi criado por diversos pintores insatisfeitos com o modelo de ensino da Enba que buscavam criar um grupo voltado ao aprimoramento técnico e a reformulação do ensino artístico.
Retrato de Machado de Assis
Em 1905, Henrique Bernardelli pintou o retrato a óleo oficial do escritor brasileiro Machado de Assis, transformando a obra em uma iconografia machadiana. A tela, segundo historiadores, foi uma encomenda para decorar uma sala da Academia Brasileira de Letras, tendo assim efeito publicitário - caracterizando o retrato pelo sua austeridade e impecabilidade mobiliária e roupa sofisticada. Henrique pinta Machado de postura firme, acentuando a linguagem clássica da pintura. O Doutor em Literatura, Victor da Rosa, traduz a ideia que o retrato procura passar da seguinte forma:
“ Dessa vez Machado aparece não mais como o escritor em ascensão (...) e sim como um verdadeiro burocrata das letras, canonizado pelas instituições, alguém que subiu todos os degraus possíveis no processo de legitimação dentro do sistema literário. ”
Atualmente, o retrato ainda localiza-se na sala da Academia brasileira de Letras, junto com o busco de bronze de Machado, feito pelo escultor Jean Magrou.
Henrique Bernardelli e o Museu Paulista
Com o centenário da independência do Brasil (1922), o historiador Afonso d'Escragnolle Taunay, então diretor do Museu Paulista, aproveitou a data comemorativa para colocar em prática um projeto voltado à memória da nacional. Taunay elaborou a organização de oito salas voltas a memória paulista de forma linear e evolutiva. Para isso, o diretor convidou alguns pintores, sendo Henrique Bernardelli um dos convidados mais ilustres. Em 1921, Bernardelli e Rodolpho Amoedo, ambos com sessenta e quatro anos, foram convidados - já que pertenciam a Escola Nacional de Belas Artes (Anba) no Rio de Janeiro. Na época, Henrique não lecionava mais na Anba, mas recebia encomendas oficiais, como o retrato do presidente Epitácio Pessoa, feito no mesmo ano.
A primeira versão do quadro O Ciclo de Caça ao Índio foi rejeitada por Taunay pelo cachorro que acompanhava o bandeirante e o chicote de couro em sua mão. Tais objetos poderiam desvalorizar a imagem do bandeirante, o que não correspondia com a imagem heroica que o diretor queria transmitir. Para Maraliz de Castro Vieira Christo, Doutora em História pela UNICAP, Henrique Bernardelli entrou em um conflito ter que retratar o bandeirante como herói sem mostra-lo como um algoz caçar do índio, tendo em vista a simbologia do mesmo que a partir da metade do século XIX passou a ser visto como "simbolo nacional, não podendo ter sua imagem associada ao canibalismo e à barbárie, que, antes, justificava a sua caça e seu aprisionamento".
A solução, segundo a Doutora, foi minimizar o enfoque relativo a escravidão indígena, deslocando a atenção para o sofrimento do homem branco no processo "civilizador". Assim, encontramos uma humanização do bandeirante e o retratando como um ser predominantemente vencido pela natureza (contrapondo-se ao projeto do Museu Paulista).
Obras Decorativas
Henrique também é responsável por importantes trabalhos decorativos, tanto em São Paulo como no Rio de Janeiro.
Os painéis O Domínio do Homem sobre as Forças da Natureza e A Luta pela Liberdade, para a Biblioteca Nacional e o teto de uma das salas do Theatro Municipal (1908), ambos no Rio de janeiro, são referência da pintura brasileira do século XX. O edifício do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA) também teve a obra de Henrique em 22 medalhões em afresco que adornam sua fachada.
Análise
O trabalho de Henrique Bernardelli marcou a história da arte brasileira e influenciou dezenas de pintores do século XX como, Manoel Santiago, Bustamante Sá, Bruno Lechowski entre outros.
Fonte: Wikipédia, consultado pela última vez em 23 de janeiro de 2020.
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Henrique Bernardelli, por José Roberto Teixeira Leite
“Os defeitos de Bernardelli foram qualidades. Um revolucionário, um inovador, não pode ser um frio desenhador da linha, nem um colorista preciso. É necessário que ele seja diferente, que seja resoluto, que pinte o que sente sem artifícios antigos, mas por artifícios modernos, porque, afinal de contas, o estilo não é mais do que um artifício empregado para exprimir as nossas emoções”.
A incompreensão de crítica e público em face da mostra de 1886 parece ter arrefecido o ímpeto do jovem artista que, a partir de então, e apesar de poucas obras notáveis, tornou-se mais cauteloso e conservador. Perderia algo daquela "maneira sólida, segura e franca" dos quadros realizados na Itália, adotando um estilo mais convencional, que por volta de 1908 chegara ao esgotamento e à conseqüente repetição: já no Salão de 1904, os retratos de Machado de Assis e Ubaldino do Amaral que expõe, merecem de Gonzaga Duque o reparo de que foram "pintados por mão de mestre, mas, não sei porque, temperados com chocolate".
Na verdade, como tantos de nossos melhores pintores de seu tempo, Henrique Bernardelli teve de seguir as duas únicas opções que se abriam a um artista brasileiro: lecionar, ou executar retratos e encomendas oficiais. Foi o que fez, dobrando-se, assim, ao gosto tradicional. De 1891 a 1905, lecionou na Escola Nacional de Belas Artes. Homem de probidade e de idéias arejadas, não aceitou que seu contrato fosse renovado naquele último ano, alegando que aos alunos devem ser oferecidos, de tempos em tempos, novos professores, para que o ensino não se torne esclerosado! Passou a ensinar pintura em sua propria residência em Copacabana, por onde passaram, entre inúmeros outros, Lucílio e Georgina de Albuquerque, Eugênio Latour, Helios Seelinger e Artur Timóteo da Costa. Prova concreta de quanto eram prezados pelos jovens artistas os dois Bernardelli, Rodolfo e Henrique, deu-se em 1931, quando um grupo de alunos da Escola Nacional de Belas Artes criou um ateliê livre de pintura, nos porões da instituição, batizando-o com o nome de Núcleo Bernardelli.
Pintor decorativista, Bernardelli fez painéis para o Teatro Municipal, para a Biblioteca Nacional, para o Cinema Pathé-Palácio; trabalhou ainda para o Museu Paulista. Mas suas obras mais importantes, no gênero, são os 22 medalhões em afresco que ornam a fachada do atual prédio do Museu Nacional de Belas Artes, na Avenida Rio Branco, expostos em 1916 no Salão e que lhe valeram a medalha de honra.
Bernardelli teve defensores entusiásticos, mesmo no ocaso da sua carreira. Assim, Angione Costa dele fala, em A inquietação das abelhas, de 1927:
“Henrique Bernardelli é um pintor que, na segunda metade da vida, sem marcar uma evolução acentuada, consegue entretanto, pintar belos quadros, nos quais o colorido é uma maravilha, e o seu pincelar seguro, um prodígio de concisão”.
Exagero sem dúvida, porquanto, após os 50 anos, Bernardelli aquietara-se, perdera os ferrões da mocidade, academizara-se em suma. O que doravante iria perpassar em sua produção seriam ecos do que anteriormente fizera, produtos concebidos e executados mecanicamente e sem emoção; nem mais aqueles "temas helênicos, influência da dança antiga, raras ressonâncias simbolistas", ou os modismos estilísticos Belle Époque que lhe surpreendeu Mário Barata; mas as composições do tipo A saúde da bela!, de um rococó anacrônico e anêmico, chupado em Fragonard e em outros artistas franceses do séc. XVIII e mesmo do séc. XIX. A que distância está-se, já agora, de Messalina, ou dos Bandeirantes!.
Henrique Bernardelli foi pintor de história e de gênero, retratista e paisagista. Praticou diversas técnicas - o óleo, a têmpera, o fresco, o pastel, a aquarela, a água-forte. Sua produção encontra-se distribuída principalmente entre o Museu Nacional de Belas Artes (120 obras de diferentes épocas e técnicas) e a Pinacoteca do Estado de São Paulo (344 desenhos, 41 aquarelas e ainda óleos). Maternidade, Tarantela, Bandeirantes, Proclamação da República são seus quadros mais conhecidos, mas não forçosamente os melhores, pois o verdadeiro Bernardelli revela-se em detalhes, aqui na vibração de uma nota de cor, ali na elegância de um arabesco ou num trecho de fatura surpreendentemente moderna, feito mediante um pincelar ágil e seguro.
José Roberto Teixeira Leite (Extraído do livro Dicionário crítico da pintura no Brasil, ArtLivre, Rio de Janeiro, 1988)
Fonte: Artedata, publicado por Carlos Roberto Maciel Levy, crítico e Historiador de arte, texto original de
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Henrique Bernardelli
Parece que era coisa de destino, o menino Henrique Bernardelli ter se tornado um artista. Tinha nas veias uma herança difícil de evitar, pois era filho de pai violinista russo e uma mãe bailarina francesa. Nasceu no Chile, mais precisamente a 15 de julho de 1857 e faleceu no Rio de Janeiro, a 6 de abril de 1936. Os pais vieram para o Rio Grande do Sul, bem no início dos anos de 1860, radicando por lá. Isso após terem feito um longo trajeto do México até o Chile. A ida para o Rio de Janeiro foi um convite feito por D. Pedro II, em 1865, quando conheceu os Bernardelli em Porto Alegre. A ida da família se deu em 1867.
Henrique Bernardelli encontrou um terreno fértil para os estudos. Matriculou-se na Academia Imperial de Belas-Artes, onde cursou até 1878. Teve como mestres ninguém menos que Zeferino da Costa, Vítor Meireles e Agostinho da Mota. Durante o curso, expôs várias vezes e em diversas delas recebeu importantes condecorações. Porém, não conseguiu o prêmio de Viagem à Europa, que o Imperador fornecia ao artista vencedor de cada salão. Foi derrotado nessa disputa por Rodolfo Amoedo. Um tanto quanto frustrado com o acontecido, decide ir para a Itália, por conta própria, a fim de polir seus estudos. Radicando-se em Roma, torna-se aluno de Domenico Morelli.
Da produção que fez na Itália, voltou um artista mais seguro, com um estilo próprio e uma certa firmeza no traço, bem diferente do que se fazia por aqui. Talvez por isso, sua exposição individual, realizada em 1886, não conquistou o gosto do público, mesmo exibindo obras que hoje são consagradas, como Tarantela, Maternidade, Messalina, Modelo em Repouso e Ao meio dia. Depois do ocorrido, tornou-se um artista mais conservador e cauteloso, perdendo um pouco da solidez adquirida na Itália e adotando um estilo mais convencional, que comprometeria um pouco sua carreira, a partir de 1908. A escolha por um estilo mais discreto e tradicional não era o que exatamente queria o artista. Como muitos grandes artistas de seu tempo, Bernardelli precisou seguir as duas únicas opções dispostas a quem viesse a produzir arte: lecionar, ou executar retratos e encomendas oficiais. E foi o que fez!
Entre os anos de 1891 e 1905, lecionou na Escola Nacional de Belas-Artes, rompendo o contrato com a escola quando viu que já não era mais possível continuar com os mesmos métodos de ensino. Passa, então, a lecionar em sua própria residência, em Copacabana, onde recebe diversos alunos, vindo a destacar entre eles, Lucílio e Georgina de Albuquerque, Eugênio Latour, Hélios Seelinger e Artur Timóteo da Costa. Os irmãos Rodolfo e Henrique Bernardelli eram muito queridos de seus discípulos, prova disso é que, em 1931, um grupo de alunos da Escola Nacional de Belas-Artes criou um ateliê livre de pintura, nos porões da instituição e deram a ele o nome de Núcleo Bernardelli.
Bernardelli era um artista versátil e tornou-se um pintor decorativista, por excelência. Realizou painéis para o Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional e para o Cine Pathé. Realizou também algumas obras para o Museu Paulista. Mas, no gênero decorativo, suas obras mais importantes são os 22 medalhões em afresco, que ornamentam a fachada do Museu Nacional de Belas-Artes, na Avenida Rio Branco. Obras que lhe valeram a Medalha de Honra, no salão de 1916.
O Museu Nacional de Belas-Artes possui 120 obras suas, de diferentes épocas e técnicas. Na Pinacoteca do Estado de São Paulo estão mais diversos trabalhos, cerca de 344 desenhos, 41 aquarelas e vários óleos. Em suma, era bem eclético. Foi um pintor de história e de gênero, retratista e paisagista. Utilizou diversas técnicas: óleo, têmpera, afresco, pastel, aquarela e água-forte.
Fonte: Jose Rosário Art, publicado por Jose Rosário em 7 de julho de 2012.
Crédito fotográfico: Jose Rosário Art, Henrique Bernardelli em foto de 1933.
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Núcleo Bernardelli
Fundado em 12 de junho de 1931 por um conjunto de pintores comprometidos com a oposição ao modelo de ensino da Escola Nacional de Belas Artes - Enba, o Núcleo Bernadelli possui como metas centrais a formação, o aprimoramento técnico e a profissionalização artísticos. "Queríamos liberdade de pesquisa e uma reformulação do ensino artístico da Escola Nacional de Belas Artes, reduto de professores reacionários, infensos às conquistas trazidas pelos modernos", afirma Edson Motta (1910 - 1981), um dos líderes do grupo. Além de democratizar o ensino, o grupo almeja permitir o acesso dos artistas modernos ao Salão Nacional de Belas Artes e aos prêmios de viagens ao exterior, dominados pelos pintores acadêmicos. O nome do grupo é uma homenagem clara a dois professores da Enba, Rodolfo Bernardelli (1852 - 1931) e Henrique Bernardelli (1858 - 1936), que no final do século XIX, insatisfeitos com o ensino da escola, mas também movidos por interesses políticos-administrativos, montam um curso paralelo na Rua do Ouvidor, no centro da cidade do Rio de Janeiro. O Núcleo Bernardelli funciona primeiramente no Studio Nicolas, do fotógrafo Nicolas Alagemovits, e muda-se em seguida para os porões da Enba, onde funciona até 1936. Nessa data, transfere-se para a Rua São José, depois para a Praça Tiradentes, n. 85, até a sua extinção em 1941. Participam do também denominado "ateliê livre", os pintores: Ado Malagoli (1906 - 1994), Bráulio Poiava (1911), Bustamante Sá (1907 - 1988), Bruno Lechowski (1887 - 1941), Sigaud (1899 - 1979), Camargo Freire (1908 - 1988), Joaquim Tenreiro (1906 - 1992), Quirino Campofiorito (1902 - 1993), Rescála (1910 - 1986), José Gomez Correia, José Pancetti (1902 - 1958), Milton Dacosta (1915 - 1988), Manoel Santiago (1897 - 1987), Yoshiya Takaoka (1909 - 1978) e Tamaki (1916 - 1979).
A criação do Núcleo Bernadelli remete a um contexto artístico, dos anos 1930 e 1940, atravessado por tentativas de ampliação dos espaços da arte e dos artistas modernos, por meio da criação de grupos e associações. A Pró-Arte Sociedade de Artes, Letras e Ciências (1931) e o Club de Cultura Moderna (1935), no Rio de Janeiro, ao lado de agremiações paulistanas como Clube dos Artistas Modernos - CAM, a Sociedade Pró - Arte Moderna - SPAM, ambos de 1932, o Grupo Santa Helena (1934) e a Família Artística Paulista - FAP (1937) são expressões do êxito do associativismo como estratégia de atuação dos artistas na vida cultural do país na época. Cada qual à sua maneira, esses grupos problematizam o legado do modernismo. Um outro esforço de modernização do ensino artístico pode ser localizado na tentativa de reforma da Enba, empreendida por Lúcio Costa (1902 - 1998) ao assumir a direção da escola, em 12 de dezembro de 1930.
Se o Núcleo Bernadelli é concebido em consonância com os projetos modernos em gestação e desenvolvimento, seu funcionamento parece mais voltado para uma tentativa de ocupação de espaço profissional do que de reformulação da linguagem artística. Trata-se fundamentalmente de incentivar o estudo e a formação pela criação de um lugar para convivência, troca de idéias e aprendizado. Desenho com modelos vivos, pintura ao ar livre, nus, naturezas-mortas, retratos e auto-retratos são realizados no ateliê, que promove também exposições das obras. Entre 1932 e 1941 são realizados cinco salões dos integrantes do Núcleo Bernadelli. Além disso, em 1933, o conjunto dessas obras é exposto no Studio Eros Volúsia e, em 1934, em mostra promovida pela Sociedade Brasileira de Belas Artes. Além das paisagens, amplamente realizadas, os artistas do grupo pintam cenas urbanas e figuras humanas. Alguns críticos sublinham a inspiração impressionista desse paisagismo, além da influência construtiva de Paul Cézanne (1839-1906), sobretudo nas naturezas-mortas de Milton Dacosta. Mas é possível localizar em parte da produção do grupo - em Malagoli, por exemplo - afinidades com o ideário do retorno à ordem. Alguns trabalhos de Malagoli, Sigaud e Campofiorito, por sua vez, anunciam questões sociais, em pauta nas manifestações artísticas da década de 1930.
Os nomes de José Pancetti e Milton Dacosta, egressos do grupo, destacam-se posteriormente em função das marcas inovadoras e pessoais dos seus trabalhos. Pancetti se notabiliza pelas marinhas que realiza, além dos diversos retratos e auto-retratos. Os anos de 1950, considerados o ápice de sua produção, conhecem as célebres Lavadeiras na Lagoa do Abaeté, as paisagens de Saquarema e cenas de Mangaratiba. Atento, desde o início de sua obra, aos desafios da composição e ao uso da cor, seus trabalhos dos anos de 1950 enfatizam a organização dos planos geométricos, fazendo com que beirem a abstracão. Milton Dacosta, responsável por uma obra convencionalmente dividida em fases em função das influências que recebe - Paul Cézanne, De Chirico (1888 - 1978), Pablo Picasso (1881 - 1973) e Giorgio Morandi (1890 - 1964) -, esteve sempre preocupado com a esquematização das formas, e recusa mesmo em suas obras figurativas dos anos 1930, qualquer inclinação naturalista mais direta. As lições construtivas, as deformações picassianas e cubistas, o equilíbrio entre planos colorísticos são todas preocupações precoces de seu trabalho (vide Paisagem de Santa Teresa, 1937), indica Mário Pedrosa (1900 - 1981). Por essa razão, o crítico defende que o abstrato é "o ponto de partida do pintor", e não apenas a marca de sua obra após a década de 1950.
Fonte: NÚCLEO Bernardelli (Rio de Janeiro, RJ). In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 19 de Jul. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
Henrique Bernardelli (Valparaíso, Chile, 15 de julho de 1858 — Rio de Janeiro, RJ, 6 de abril de 1936) foi um pintor, desenhista, gravador e professor chileno, radicado na Itália e Brasil. Umas das obras mais emblemáticas do pintor é o retrato de Machado de Assis para a Academia Brasileira de Letras. É irmão do escultor Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e do violonista e pintor Felix Bernadelli (1862-1905).
Biografia - Itaú Cultural
Chega com a família ao Brasil no começo da década de 1860, se estabelecendo no Rio Grande do Sul. Em 1867, transfere-se para o Rio de Janeiro. Três anos depois, matricula-se na Academia Imperial de Belas Artes (Aiba), juntamente com o irmão Rodolfo. É aluno de Zeferino da Costa (1840-1915), Agostinho da Motta (1824-1878) e Victor Meirelles (1832-1903). Viaja para a Itália em 1878. Em Roma, freqüenta o ateliê de Domenico Morelli (1826-1901) com quem estuda até 1886. Volta ao Brasil no mesmo ano, realiza no Rio de Janeiro uma exposição individual que causa interesse e polêmica no meio local. São apresentadas, entre outras obras, Tarantela (1886), Maternidade (1878), Messalina (1880), Modelo em Repouso (ca.1881) e Ao Meio Dia.
Leciona na Escola Nacional de Belas Artes (Enba) de 1891 a 1905, quando não aceita a renovação de seu contrato, alegando que a instituição precisa renovar seus quadros periodicamente. Juntamente com o irmão, passa a lecionar em um ateliê particular, na Rua do Ouvidor, no Rio de Janeiro, onde estudam, entre outros, Lucílio de Albuquerque (1885-1962) e Georgina de Albuquerque (1885-1962), Eugênio Latour (1874-1942), Hélios Seelinger (1878-1965) e Arthur Timótheo da Costa (1822-1922).
Na década de 1890, realiza importantes trabalhos decorativos, como a pintura de painéis para o interior do Theatro Municipal, os painéis O Domínio do Homem sobre as Forças da Natureza e A Luta pela Liberdade, para a Biblioteca Nacional , ambos no Rio de Janeiro, e para o Museu Paulista, em São Paulo. Merecem especial destaque os 22 medalhões em afresco que adornam a fachada do atual edifício do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA), expostos no Salão da Enba de 1916. Em 1931, diversos pintores insatisfeitos com o modelo de ensino da Enba organizam-se coletivamente criando um grupo voltado ao aprimoramento técnico e a reformulação do ensino artístico, dando-lhe o nome de Núcleo Bernardelli em homenagem aos professores Henrique e Rodolfo.
Críticas
"Bernardelli foi o primeiro pintor brasileiro a extrair todos os fundamentos de sua experiência artística dos processos, hábitos técnicos e cores da pintura italiana praticada por muitos artistas do século XIX (...). O sentido do primado conferido à objetividade sem concessões a sentimentalismos a despeito do tema que, em outro pintor, poderia dar margem a divagações psicológicas ou a pieguismos vulgares. A reflexão em torno de temas não era de seu feitio. Suas vivências refletiam e desdobravam-se em suas pinturas sacras ou profanas, ao contato com o modelo real sem maiores compromissos com o transcendental, no primeiro caso, e sentimentalismo no outro. A constituição psicológica e a formação emocional de Bernardelli era a do homem que conferia primado à matéria. Sua consciência e sua arte só tinham compromissos com os efeitos que ele admitia como realidade. E uma realidade sólida e bem estruturada sob a qual, pintando, não empregava recursos de tonalidade tênue, transparências ou reflexos de efeitos ligeiros e fáceis. Aplicava tintas em plena pasta e pinceladas marcadas, acompanhando, o mais das vezes, o movimento das formas representadas e conseguindo dessa forma uma evidente sensação de volume".
Edson Motta e equipe do MNBA (Museu Nacional de Belas Artes. Apresentação Roberto Daniel Martins Parreira; texto Edson Motta. Rio de Janeiro: Funarte, 1979. 196 p. , il. color.)
"(...) após oito anos de estudo em Roma, Henrique Bernardelli (...) impõe-se de pronto e sem despertar polêmica sobre a obra que trazia e a marcante personalidade que demonstrava, a não ser por parte de alguns críticos mais limitados. Estranhavam estes as influências que traziam da pintura italiana do fim do século (...). Sucedia apenas que Henrique Bernardelli escapava àquele semblante do oficialismo artístico de Paris, que conformando tudo o que poderia ser admitido como pintura válida em nosso meio, acabara, por força do hábito, a assemelhar-se a uma condição marcante da criatividade nacional. (...) O que havia de mais particular na obra trazida pelo jovem pintor recém-chegado era o aspecto de uma pintura nova para o que aqui se conhecia. Não exatamente a diferença de um academismo francês em relação a outro italiano, mas principalmente pelo artista desfazer-se de preocupações técnicas e estéticas conservadoras e abrir uma nova visão para a pintura (...). Logo se deixa perceber, nas telas trazidas por Henrique, que muito havia de popular, de tendência a acentuar a naturalidade das coisas, dos fatos, enfim uma visão subordinada às sugestões diretas da natureza, o que exigia desprendimento técnico e capacidade de improvisação para o domínio sobre novos efeitos visuais".
Quirino Campofiorito (História da pintura brasileira no século XIX. Prefácio Carlos Roberto Maciel Levy. Rio de Janeiro: Pinakotheke, 1983. 292 p. , il color)
"Bernardelli é um robusto moço dotado de talento omnímodo e, por hereditariedade, de verdadeiro sentimento artístico. Os seus trabalhos inculcam um temperamento irrequieto, nervoso, sôfrego de impressões, uma dessas organizações atléticas, munidas de espátulas largas, forte peito, músculos desenvolvidos e reforçados pelo higiênico exercício das caminhadas ao ar livre, pelo alto das montanhas. A sua obra é vigorosa, original, cheia de calor, cheia de ousadia. Cheia de ousadia! sim, porque ela é nova, porque ultrapassa os arruinados sistemas da confecção acadêmica, porque faz sentir o caráter essencial do objeto, segundo a expressão de H. Taine; porque comove e é pessoal e é verdadeira. Veja-se um quadro de mestre, qualquer dos 'nossos mestres' e enquanto a obra deste consegue, unicamente, da nossa atenção um qualificativo, algumas vezes destilado pela complacência; a obra daquele nos impressiona, nos desperta alguma emoção nova, nos provoca admiração ou ódio. Eis onde está a superioridade do artista".
Gonzaga Duque (A arte brasileira. Introdução Tadeu Chiarelli. Campinas: Mercado de Letras, 1995. 270 p.)
Prêmios:
1871 - Menção em Desenho de ornatos
1872 - Pequena medalha de ouro em Desenho figurado
1873 - Menção em Desenho figurado
1874 - Grande medalha de ouro em Desenho figurado
1876 - Medalha de prata em Pintura histórica
1877 - Pequena medalha de ouro em Pintura histórica e Pequena medalha de ouro em Modelo vivo
Exposições Individuais
1886 - Rio de Janeiro RJ - Individual, na Enba
Exposições Coletivas
1870 - Rio de Janeiro RJ - 21ª Exposição Geral de Belas Artes, na Aiba
1884 - Rio de Janeiro RJ - 26ª Exposição Geral de Belas Artes, na Aiba - medalha de ouro de 1ª classe
1886 - Rio de Janeiro RJ - Nicolau Facchinetti e Henrique Bernardelli, na Imprensa Nacional
1887 - Rio de Janeiro RJ - Antônio Parreiras, Castagento e Henrique Bernardelli, no Grêmio de Letras e Artes.
1889 - Paris (França) - Exposição Universal - medalha de bronze
1890 - Rio de Janeiro RJ - Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1894 - Rio de Janeiro RJ - 1ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1895 - Rio de Janeiro RJ - 2ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1896 - Rio de Janeiro RJ - 3ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1897 - Rio de Janeiro RJ - 4ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1898 - Rio de Janeiro RJ - 5ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1900 - Rio de Janeiro RJ - 7ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1901 - Rio de Janeiro RJ - 8ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1902 - Rio de Janeiro RJ - 9ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1903 - Rio de Janeiro RJ - 10ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1904 - Rio de Janeiro RJ - 11ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1905 - Rio de Janeiro RJ - 12ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1907 - Rio de Janeiro RJ - 14ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1909 - Rio de Janeiro RJ - 16ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1910 - Rio de Janeiro RJ - 17ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1911 - São Paulo SP - Primeira Exposição Brasileira de Belas Artes, no Liceu de Artes e Ofícios
1916 - Rio de Janeiro RJ - 23ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1927 - Rio de Janeiro RJ - 34ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1928 - Rio de Janeiro RJ - 35ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1929 - Rio de Janeiro RJ - 36ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1930 - Rio de Janeiro RJ - 37ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1931 - Rio de Janeiro RJ - Galeria Irmãos Bernardelli, no Mnba
1931 - Rio de Janeiro RJ - Salão Revolucionário, na Enba
1933 - Rio de Janeiro RJ - 40ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1934 - Rio de Janeiro RJ - 3º Salão do Núcleo Bernardelli, na Enba
1935 - Rio de Janeiro RJ - 4º Salão do Núcleo Bernardelli, na Enba
Exposições Póstumas
1948 - Rio de Janeiro RJ - Retrospectiva da Pintura no Brasil, no Mnba
1950 - Rio de Janeiro RJ - Um Século da Pintura Brasileira: 1850-1950, no Mnba
1970 - São Paulo SP - Pinacoteca do Estado de São Paulo 1970, na Pesp
1976 - São Paulo SP - Henrique Bernardelli: uma coleção de desenhos, na Pesp
1976 - São Paulo SP - O Retrato na Coleção da Pinacoteca, na Pinacoteca do Estado
1980 - São Paulo SP - A Paisagem Brasileira: 1650-1976, no Paço das Artes
1984 - Rio de Janeiro RJ - 7º Salão Nacional de Artes Plásticas - Salão de 31, no Mnba
1984 - São Paulo SP - Tradição e Ruptura: síntese de arte e cultura brasileiras, na Fundação Bienal
1986 - São Paulo SP - Dezenovevinte: uma virada no século, na Pesp
1986 - Rio de Janeiro RJ - Henrique Bernardelli, no MNBA
1986 - Rio de Janeiro RJ - Mostra Comemorativa dos 50 Anos da Sua Morte, no Mnba
1989 - Fortaleza CE - Arte Brasileira dos Séculos XIX e XX nas Coleções Cearenses: pinturas e desenhos, no Espaço Cultural da Unifor
1991 - São Paulo SP - O Desejo na Academia: 1847-1916, na Pesp
1994 - São Paulo SP - Um Olhar Crítico sobre o Acervo do Século XIX, na Pesp
1995 - Rio de Janeiro RJ - Mostra Acervo Caixa Econômica Federal, no Espaço Arte Barrashopping
2000 - São Paulo SP - Brasil + 500 Mostra do Redescobrimento. Arte no Século XIX, na Fundação Bienal
2000 - Porto Alegre RS - De Frans Post a Eliseu Visconti: acervo Museu Nacional de Belas Artes-RJ, no Margs
2001 - São Paulo SP - 30 Mestres da Pintura no Brasil, no Masp
2001 - Rio de Janeiro RJ - Aquarela Brasileira, no Centro Cultural Light
2001 - São Paulo SP - Trajetória da Luz na Arte Brasileira, no Itaú Cultural
2002 - Brasília DF - Barão do Rio Branco: sua obra e seu tempo, no Ministério das Relações Exteriores. Palácio do Itamaraty
2002 - Niterói RJ - Arte Brasileira sobre Papel: séculos XIX e XX, no Solar do Jambeiro
2002 - São Paulo SP - Imagem e Identidade: um olhar sobre a história na coleção do Museu de Belas Artes, no Instituto Cultural Banco Santos
Fonte: HENRIQUE Bernardelli. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 19 de Jul. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
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Vida e obra - Wikipédia
Henrique Bernardelli nasceu em Valparaíso, no Chile, em 1858 e se mudou com seus pais e irmãos - o escultor Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e o violonista e pintor Felix Bernardelli (1862-1905) - para o Rio Grande do Sul, no Brasil, no começo da década de 1860. A família transfere-se para o Rio de Janeiro em 1867. Em 1870 matriculou-se, juntamente com o irmão Rodolfo, na Academia Imperial de Belas Artes, estudando com pintores de destacada importância, como Victor Meireles e Agostinho José da Mota. Henrique torna-se aluno de Zeferino da Costa (1840-1915), Agostinho da Motta (1824-1878) e Victor Meirelles (1832-1903).
Em 1878 naturalizou-se brasileiro para poder concorrer ao Prêmio de Viagem à Europa concedido pela AIBA. Após perder o prêmio para Rodolfo Amoedo, viajou para Roma, em 1878, com recursos próprios. Em Roma, estuda e frequenta o ateliê de Domenico Morelli (1826-1901), entrando em contato com as obras de artistas como Francesco Paolo Michetti e Giovanni Segantini.
Ao retornar ao Rio de Janeiro, em 1888, Henrique realiza uma série de exposições individuais como a Exposição Universal de Paris, ganhando medalha de bronze com a tela Os Bandeirantes; em 1890, da Exposição Geral das Belas Artes, onde destaca-se com obras como Dicteriade, Tarantella e Calle de Venezia; e em 1893, da Exposição Universal de Chicago, com Messalina, Mater e Proclamação da República. É neste momento que as obras Tarantela (1886), Maternidade (1878), Messalina (1880), Modelo em Repouso (ca.1881) e Ao Meio Dia são apresentadas ao público.
Em 1891 tornou-se professor de pintura na recém-inaugurada Escola Nacional de Belas Artes e encerra seu contrato em 1905. Henrique deixa de lecionar na faculdade alegando que a instituição precisa renovar seus quadros periodicamente. Ele e seu irmão Rodolfo passam a lecionar em um ateliê particular no Rio de Janeiro. Lucílio de Albuquerque (1885-1962) e Georgina de Albuquerque (1885-1962), Eugênio Latour (1874-1942), Hélios Seelinger (1878-1965) e Arthur Timótheo da Costa (1822-1922) são um dos seus principais alunos de destaque.
O artista manteve vivo o contato com a cultura figurativa italiana, viajando constantemente para cidades como Roma, Nápoles e Veneza. Lecionou na Escola até ser substituído por Eliseu Visconti, em 1906, passando então a dar aulas particulares em seu ateliê, recebendo concomitantemente encomendas particulares.
Em 1916, conquistou uma das mais altas premiações que um artista plástico pode aspirar no Brasil: a medalha de honra. Foi também membro do Conselho Superior de Belas Artes, para o qual prestou relevantes serviços.
Grande parte da obra de Henrique Bernardelli foi doada à Pinacoteca do Estado conforme mostra o seu último catálogo.
Vê-se uma herma sua na Praça do Lido, em Copacabana, obra do escultor Leão Veloso.
Em 1931, o Núcleo Bernardelli, em homenagem aos professores Henrique e Rodolfo, foi criado por diversos pintores insatisfeitos com o modelo de ensino da Enba que buscavam criar um grupo voltado ao aprimoramento técnico e a reformulação do ensino artístico.
Retrato de Machado de Assis
Em 1905, Henrique Bernardelli pintou o retrato a óleo oficial do escritor brasileiro Machado de Assis, transformando a obra em uma iconografia machadiana. A tela, segundo historiadores, foi uma encomenda para decorar uma sala da Academia Brasileira de Letras, tendo assim efeito publicitário - caracterizando o retrato pelo sua austeridade e impecabilidade mobiliária e roupa sofisticada. Henrique pinta Machado de postura firme, acentuando a linguagem clássica da pintura. O Doutor em Literatura, Victor da Rosa, traduz a ideia que o retrato procura passar da seguinte forma:
“ Dessa vez Machado aparece não mais como o escritor em ascensão (...) e sim como um verdadeiro burocrata das letras, canonizado pelas instituições, alguém que subiu todos os degraus possíveis no processo de legitimação dentro do sistema literário. ”
Atualmente, o retrato ainda localiza-se na sala da Academia brasileira de Letras, junto com o busco de bronze de Machado, feito pelo escultor Jean Magrou.
Henrique Bernardelli e o Museu Paulista
Com o centenário da independência do Brasil (1922), o historiador Afonso d'Escragnolle Taunay, então diretor do Museu Paulista, aproveitou a data comemorativa para colocar em prática um projeto voltado à memória da nacional. Taunay elaborou a organização de oito salas voltas a memória paulista de forma linear e evolutiva. Para isso, o diretor convidou alguns pintores, sendo Henrique Bernardelli um dos convidados mais ilustres. Em 1921, Bernardelli e Rodolpho Amoedo, ambos com sessenta e quatro anos, foram convidados - já que pertenciam a Escola Nacional de Belas Artes (Anba) no Rio de Janeiro. Na época, Henrique não lecionava mais na Anba, mas recebia encomendas oficiais, como o retrato do presidente Epitácio Pessoa, feito no mesmo ano.
A primeira versão do quadro O Ciclo de Caça ao Índio foi rejeitada por Taunay pelo cachorro que acompanhava o bandeirante e o chicote de couro em sua mão. Tais objetos poderiam desvalorizar a imagem do bandeirante, o que não correspondia com a imagem heroica que o diretor queria transmitir. Para Maraliz de Castro Vieira Christo, Doutora em História pela UNICAP, Henrique Bernardelli entrou em um conflito ter que retratar o bandeirante como herói sem mostra-lo como um algoz caçar do índio, tendo em vista a simbologia do mesmo que a partir da metade do século XIX passou a ser visto como "simbolo nacional, não podendo ter sua imagem associada ao canibalismo e à barbárie, que, antes, justificava a sua caça e seu aprisionamento".
A solução, segundo a Doutora, foi minimizar o enfoque relativo a escravidão indígena, deslocando a atenção para o sofrimento do homem branco no processo "civilizador". Assim, encontramos uma humanização do bandeirante e o retratando como um ser predominantemente vencido pela natureza (contrapondo-se ao projeto do Museu Paulista).
Obras Decorativas
Henrique também é responsável por importantes trabalhos decorativos, tanto em São Paulo como no Rio de Janeiro.
Os painéis O Domínio do Homem sobre as Forças da Natureza e A Luta pela Liberdade, para a Biblioteca Nacional e o teto de uma das salas do Theatro Municipal (1908), ambos no Rio de janeiro, são referência da pintura brasileira do século XX. O edifício do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA) também teve a obra de Henrique em 22 medalhões em afresco que adornam sua fachada.
Análise
O trabalho de Henrique Bernardelli marcou a história da arte brasileira e influenciou dezenas de pintores do século XX como, Manoel Santiago, Bustamante Sá, Bruno Lechowski entre outros.
Fonte: Wikipédia, consultado pela última vez em 23 de janeiro de 2020.
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Henrique Bernardelli, por José Roberto Teixeira Leite
“Os defeitos de Bernardelli foram qualidades. Um revolucionário, um inovador, não pode ser um frio desenhador da linha, nem um colorista preciso. É necessário que ele seja diferente, que seja resoluto, que pinte o que sente sem artifícios antigos, mas por artifícios modernos, porque, afinal de contas, o estilo não é mais do que um artifício empregado para exprimir as nossas emoções”.
A incompreensão de crítica e público em face da mostra de 1886 parece ter arrefecido o ímpeto do jovem artista que, a partir de então, e apesar de poucas obras notáveis, tornou-se mais cauteloso e conservador. Perderia algo daquela "maneira sólida, segura e franca" dos quadros realizados na Itália, adotando um estilo mais convencional, que por volta de 1908 chegara ao esgotamento e à conseqüente repetição: já no Salão de 1904, os retratos de Machado de Assis e Ubaldino do Amaral que expõe, merecem de Gonzaga Duque o reparo de que foram "pintados por mão de mestre, mas, não sei porque, temperados com chocolate".
Na verdade, como tantos de nossos melhores pintores de seu tempo, Henrique Bernardelli teve de seguir as duas únicas opções que se abriam a um artista brasileiro: lecionar, ou executar retratos e encomendas oficiais. Foi o que fez, dobrando-se, assim, ao gosto tradicional. De 1891 a 1905, lecionou na Escola Nacional de Belas Artes. Homem de probidade e de idéias arejadas, não aceitou que seu contrato fosse renovado naquele último ano, alegando que aos alunos devem ser oferecidos, de tempos em tempos, novos professores, para que o ensino não se torne esclerosado! Passou a ensinar pintura em sua propria residência em Copacabana, por onde passaram, entre inúmeros outros, Lucílio e Georgina de Albuquerque, Eugênio Latour, Helios Seelinger e Artur Timóteo da Costa. Prova concreta de quanto eram prezados pelos jovens artistas os dois Bernardelli, Rodolfo e Henrique, deu-se em 1931, quando um grupo de alunos da Escola Nacional de Belas Artes criou um ateliê livre de pintura, nos porões da instituição, batizando-o com o nome de Núcleo Bernardelli.
Pintor decorativista, Bernardelli fez painéis para o Teatro Municipal, para a Biblioteca Nacional, para o Cinema Pathé-Palácio; trabalhou ainda para o Museu Paulista. Mas suas obras mais importantes, no gênero, são os 22 medalhões em afresco que ornam a fachada do atual prédio do Museu Nacional de Belas Artes, na Avenida Rio Branco, expostos em 1916 no Salão e que lhe valeram a medalha de honra.
Bernardelli teve defensores entusiásticos, mesmo no ocaso da sua carreira. Assim, Angione Costa dele fala, em A inquietação das abelhas, de 1927:
“Henrique Bernardelli é um pintor que, na segunda metade da vida, sem marcar uma evolução acentuada, consegue entretanto, pintar belos quadros, nos quais o colorido é uma maravilha, e o seu pincelar seguro, um prodígio de concisão”.
Exagero sem dúvida, porquanto, após os 50 anos, Bernardelli aquietara-se, perdera os ferrões da mocidade, academizara-se em suma. O que doravante iria perpassar em sua produção seriam ecos do que anteriormente fizera, produtos concebidos e executados mecanicamente e sem emoção; nem mais aqueles "temas helênicos, influência da dança antiga, raras ressonâncias simbolistas", ou os modismos estilísticos Belle Époque que lhe surpreendeu Mário Barata; mas as composições do tipo A saúde da bela!, de um rococó anacrônico e anêmico, chupado em Fragonard e em outros artistas franceses do séc. XVIII e mesmo do séc. XIX. A que distância está-se, já agora, de Messalina, ou dos Bandeirantes!.
Henrique Bernardelli foi pintor de história e de gênero, retratista e paisagista. Praticou diversas técnicas - o óleo, a têmpera, o fresco, o pastel, a aquarela, a água-forte. Sua produção encontra-se distribuída principalmente entre o Museu Nacional de Belas Artes (120 obras de diferentes épocas e técnicas) e a Pinacoteca do Estado de São Paulo (344 desenhos, 41 aquarelas e ainda óleos). Maternidade, Tarantela, Bandeirantes, Proclamação da República são seus quadros mais conhecidos, mas não forçosamente os melhores, pois o verdadeiro Bernardelli revela-se em detalhes, aqui na vibração de uma nota de cor, ali na elegância de um arabesco ou num trecho de fatura surpreendentemente moderna, feito mediante um pincelar ágil e seguro.
José Roberto Teixeira Leite (Extraído do livro Dicionário crítico da pintura no Brasil, ArtLivre, Rio de Janeiro, 1988)
Fonte: Artedata, publicado por Carlos Roberto Maciel Levy, crítico e Historiador de arte, texto original de
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Henrique Bernardelli
Parece que era coisa de destino, o menino Henrique Bernardelli ter se tornado um artista. Tinha nas veias uma herança difícil de evitar, pois era filho de pai violinista russo e uma mãe bailarina francesa. Nasceu no Chile, mais precisamente a 15 de julho de 1857 e faleceu no Rio de Janeiro, a 6 de abril de 1936. Os pais vieram para o Rio Grande do Sul, bem no início dos anos de 1860, radicando por lá. Isso após terem feito um longo trajeto do México até o Chile. A ida para o Rio de Janeiro foi um convite feito por D. Pedro II, em 1865, quando conheceu os Bernardelli em Porto Alegre. A ida da família se deu em 1867.
Henrique Bernardelli encontrou um terreno fértil para os estudos. Matriculou-se na Academia Imperial de Belas-Artes, onde cursou até 1878. Teve como mestres ninguém menos que Zeferino da Costa, Vítor Meireles e Agostinho da Mota. Durante o curso, expôs várias vezes e em diversas delas recebeu importantes condecorações. Porém, não conseguiu o prêmio de Viagem à Europa, que o Imperador fornecia ao artista vencedor de cada salão. Foi derrotado nessa disputa por Rodolfo Amoedo. Um tanto quanto frustrado com o acontecido, decide ir para a Itália, por conta própria, a fim de polir seus estudos. Radicando-se em Roma, torna-se aluno de Domenico Morelli.
Da produção que fez na Itália, voltou um artista mais seguro, com um estilo próprio e uma certa firmeza no traço, bem diferente do que se fazia por aqui. Talvez por isso, sua exposição individual, realizada em 1886, não conquistou o gosto do público, mesmo exibindo obras que hoje são consagradas, como Tarantela, Maternidade, Messalina, Modelo em Repouso e Ao meio dia. Depois do ocorrido, tornou-se um artista mais conservador e cauteloso, perdendo um pouco da solidez adquirida na Itália e adotando um estilo mais convencional, que comprometeria um pouco sua carreira, a partir de 1908. A escolha por um estilo mais discreto e tradicional não era o que exatamente queria o artista. Como muitos grandes artistas de seu tempo, Bernardelli precisou seguir as duas únicas opções dispostas a quem viesse a produzir arte: lecionar, ou executar retratos e encomendas oficiais. E foi o que fez!
Entre os anos de 1891 e 1905, lecionou na Escola Nacional de Belas-Artes, rompendo o contrato com a escola quando viu que já não era mais possível continuar com os mesmos métodos de ensino. Passa, então, a lecionar em sua própria residência, em Copacabana, onde recebe diversos alunos, vindo a destacar entre eles, Lucílio e Georgina de Albuquerque, Eugênio Latour, Hélios Seelinger e Artur Timóteo da Costa. Os irmãos Rodolfo e Henrique Bernardelli eram muito queridos de seus discípulos, prova disso é que, em 1931, um grupo de alunos da Escola Nacional de Belas-Artes criou um ateliê livre de pintura, nos porões da instituição e deram a ele o nome de Núcleo Bernardelli.
Bernardelli era um artista versátil e tornou-se um pintor decorativista, por excelência. Realizou painéis para o Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional e para o Cine Pathé. Realizou também algumas obras para o Museu Paulista. Mas, no gênero decorativo, suas obras mais importantes são os 22 medalhões em afresco, que ornamentam a fachada do Museu Nacional de Belas-Artes, na Avenida Rio Branco. Obras que lhe valeram a Medalha de Honra, no salão de 1916.
O Museu Nacional de Belas-Artes possui 120 obras suas, de diferentes épocas e técnicas. Na Pinacoteca do Estado de São Paulo estão mais diversos trabalhos, cerca de 344 desenhos, 41 aquarelas e vários óleos. Em suma, era bem eclético. Foi um pintor de história e de gênero, retratista e paisagista. Utilizou diversas técnicas: óleo, têmpera, afresco, pastel, aquarela e água-forte.
Fonte: Jose Rosário Art, publicado por Jose Rosário em 7 de julho de 2012.
Crédito fotográfico: Jose Rosário Art, Henrique Bernardelli em foto de 1933.
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Núcleo Bernardelli
Fundado em 12 de junho de 1931 por um conjunto de pintores comprometidos com a oposição ao modelo de ensino da Escola Nacional de Belas Artes - Enba, o Núcleo Bernadelli possui como metas centrais a formação, o aprimoramento técnico e a profissionalização artísticos. "Queríamos liberdade de pesquisa e uma reformulação do ensino artístico da Escola Nacional de Belas Artes, reduto de professores reacionários, infensos às conquistas trazidas pelos modernos", afirma Edson Motta (1910 - 1981), um dos líderes do grupo. Além de democratizar o ensino, o grupo almeja permitir o acesso dos artistas modernos ao Salão Nacional de Belas Artes e aos prêmios de viagens ao exterior, dominados pelos pintores acadêmicos. O nome do grupo é uma homenagem clara a dois professores da Enba, Rodolfo Bernardelli (1852 - 1931) e Henrique Bernardelli (1858 - 1936), que no final do século XIX, insatisfeitos com o ensino da escola, mas também movidos por interesses políticos-administrativos, montam um curso paralelo na Rua do Ouvidor, no centro da cidade do Rio de Janeiro. O Núcleo Bernardelli funciona primeiramente no Studio Nicolas, do fotógrafo Nicolas Alagemovits, e muda-se em seguida para os porões da Enba, onde funciona até 1936. Nessa data, transfere-se para a Rua São José, depois para a Praça Tiradentes, n. 85, até a sua extinção em 1941. Participam do também denominado "ateliê livre", os pintores: Ado Malagoli (1906 - 1994), Bráulio Poiava (1911), Bustamante Sá (1907 - 1988), Bruno Lechowski (1887 - 1941), Sigaud (1899 - 1979), Camargo Freire (1908 - 1988), Joaquim Tenreiro (1906 - 1992), Quirino Campofiorito (1902 - 1993), Rescála (1910 - 1986), José Gomez Correia, José Pancetti (1902 - 1958), Milton Dacosta (1915 - 1988), Manoel Santiago (1897 - 1987), Yoshiya Takaoka (1909 - 1978) e Tamaki (1916 - 1979).
A criação do Núcleo Bernadelli remete a um contexto artístico, dos anos 1930 e 1940, atravessado por tentativas de ampliação dos espaços da arte e dos artistas modernos, por meio da criação de grupos e associações. A Pró-Arte Sociedade de Artes, Letras e Ciências (1931) e o Club de Cultura Moderna (1935), no Rio de Janeiro, ao lado de agremiações paulistanas como Clube dos Artistas Modernos - CAM, a Sociedade Pró - Arte Moderna - SPAM, ambos de 1932, o Grupo Santa Helena (1934) e a Família Artística Paulista - FAP (1937) são expressões do êxito do associativismo como estratégia de atuação dos artistas na vida cultural do país na época. Cada qual à sua maneira, esses grupos problematizam o legado do modernismo. Um outro esforço de modernização do ensino artístico pode ser localizado na tentativa de reforma da Enba, empreendida por Lúcio Costa (1902 - 1998) ao assumir a direção da escola, em 12 de dezembro de 1930.
Se o Núcleo Bernadelli é concebido em consonância com os projetos modernos em gestação e desenvolvimento, seu funcionamento parece mais voltado para uma tentativa de ocupação de espaço profissional do que de reformulação da linguagem artística. Trata-se fundamentalmente de incentivar o estudo e a formação pela criação de um lugar para convivência, troca de idéias e aprendizado. Desenho com modelos vivos, pintura ao ar livre, nus, naturezas-mortas, retratos e auto-retratos são realizados no ateliê, que promove também exposições das obras. Entre 1932 e 1941 são realizados cinco salões dos integrantes do Núcleo Bernadelli. Além disso, em 1933, o conjunto dessas obras é exposto no Studio Eros Volúsia e, em 1934, em mostra promovida pela Sociedade Brasileira de Belas Artes. Além das paisagens, amplamente realizadas, os artistas do grupo pintam cenas urbanas e figuras humanas. Alguns críticos sublinham a inspiração impressionista desse paisagismo, além da influência construtiva de Paul Cézanne (1839-1906), sobretudo nas naturezas-mortas de Milton Dacosta. Mas é possível localizar em parte da produção do grupo - em Malagoli, por exemplo - afinidades com o ideário do retorno à ordem. Alguns trabalhos de Malagoli, Sigaud e Campofiorito, por sua vez, anunciam questões sociais, em pauta nas manifestações artísticas da década de 1930.
Os nomes de José Pancetti e Milton Dacosta, egressos do grupo, destacam-se posteriormente em função das marcas inovadoras e pessoais dos seus trabalhos. Pancetti se notabiliza pelas marinhas que realiza, além dos diversos retratos e auto-retratos. Os anos de 1950, considerados o ápice de sua produção, conhecem as célebres Lavadeiras na Lagoa do Abaeté, as paisagens de Saquarema e cenas de Mangaratiba. Atento, desde o início de sua obra, aos desafios da composição e ao uso da cor, seus trabalhos dos anos de 1950 enfatizam a organização dos planos geométricos, fazendo com que beirem a abstracão. Milton Dacosta, responsável por uma obra convencionalmente dividida em fases em função das influências que recebe - Paul Cézanne, De Chirico (1888 - 1978), Pablo Picasso (1881 - 1973) e Giorgio Morandi (1890 - 1964) -, esteve sempre preocupado com a esquematização das formas, e recusa mesmo em suas obras figurativas dos anos 1930, qualquer inclinação naturalista mais direta. As lições construtivas, as deformações picassianas e cubistas, o equilíbrio entre planos colorísticos são todas preocupações precoces de seu trabalho (vide Paisagem de Santa Teresa, 1937), indica Mário Pedrosa (1900 - 1981). Por essa razão, o crítico defende que o abstrato é "o ponto de partida do pintor", e não apenas a marca de sua obra após a década de 1950.
Fonte: NÚCLEO Bernardelli (Rio de Janeiro, RJ). In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 19 de Jul. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
Henrique Bernardelli (Valparaíso, Chile, 15 de julho de 1858 — Rio de Janeiro, RJ, 6 de abril de 1936) foi um pintor, desenhista, gravador e professor chileno, radicado na Itália e Brasil. Umas das obras mais emblemáticas do pintor é o retrato de Machado de Assis para a Academia Brasileira de Letras. É irmão do escultor Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e do violonista e pintor Felix Bernadelli (1862-1905).
Biografia - Itaú Cultural
Chega com a família ao Brasil no começo da década de 1860, se estabelecendo no Rio Grande do Sul. Em 1867, transfere-se para o Rio de Janeiro. Três anos depois, matricula-se na Academia Imperial de Belas Artes (Aiba), juntamente com o irmão Rodolfo. É aluno de Zeferino da Costa (1840-1915), Agostinho da Motta (1824-1878) e Victor Meirelles (1832-1903). Viaja para a Itália em 1878. Em Roma, freqüenta o ateliê de Domenico Morelli (1826-1901) com quem estuda até 1886. Volta ao Brasil no mesmo ano, realiza no Rio de Janeiro uma exposição individual que causa interesse e polêmica no meio local. São apresentadas, entre outras obras, Tarantela (1886), Maternidade (1878), Messalina (1880), Modelo em Repouso (ca.1881) e Ao Meio Dia.
Leciona na Escola Nacional de Belas Artes (Enba) de 1891 a 1905, quando não aceita a renovação de seu contrato, alegando que a instituição precisa renovar seus quadros periodicamente. Juntamente com o irmão, passa a lecionar em um ateliê particular, na Rua do Ouvidor, no Rio de Janeiro, onde estudam, entre outros, Lucílio de Albuquerque (1885-1962) e Georgina de Albuquerque (1885-1962), Eugênio Latour (1874-1942), Hélios Seelinger (1878-1965) e Arthur Timótheo da Costa (1822-1922).
Na década de 1890, realiza importantes trabalhos decorativos, como a pintura de painéis para o interior do Theatro Municipal, os painéis O Domínio do Homem sobre as Forças da Natureza e A Luta pela Liberdade, para a Biblioteca Nacional , ambos no Rio de Janeiro, e para o Museu Paulista, em São Paulo. Merecem especial destaque os 22 medalhões em afresco que adornam a fachada do atual edifício do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA), expostos no Salão da Enba de 1916. Em 1931, diversos pintores insatisfeitos com o modelo de ensino da Enba organizam-se coletivamente criando um grupo voltado ao aprimoramento técnico e a reformulação do ensino artístico, dando-lhe o nome de Núcleo Bernardelli em homenagem aos professores Henrique e Rodolfo.
Críticas
"Bernardelli foi o primeiro pintor brasileiro a extrair todos os fundamentos de sua experiência artística dos processos, hábitos técnicos e cores da pintura italiana praticada por muitos artistas do século XIX (...). O sentido do primado conferido à objetividade sem concessões a sentimentalismos a despeito do tema que, em outro pintor, poderia dar margem a divagações psicológicas ou a pieguismos vulgares. A reflexão em torno de temas não era de seu feitio. Suas vivências refletiam e desdobravam-se em suas pinturas sacras ou profanas, ao contato com o modelo real sem maiores compromissos com o transcendental, no primeiro caso, e sentimentalismo no outro. A constituição psicológica e a formação emocional de Bernardelli era a do homem que conferia primado à matéria. Sua consciência e sua arte só tinham compromissos com os efeitos que ele admitia como realidade. E uma realidade sólida e bem estruturada sob a qual, pintando, não empregava recursos de tonalidade tênue, transparências ou reflexos de efeitos ligeiros e fáceis. Aplicava tintas em plena pasta e pinceladas marcadas, acompanhando, o mais das vezes, o movimento das formas representadas e conseguindo dessa forma uma evidente sensação de volume".
Edson Motta e equipe do MNBA (Museu Nacional de Belas Artes. Apresentação Roberto Daniel Martins Parreira; texto Edson Motta. Rio de Janeiro: Funarte, 1979. 196 p. , il. color.)
"(...) após oito anos de estudo em Roma, Henrique Bernardelli (...) impõe-se de pronto e sem despertar polêmica sobre a obra que trazia e a marcante personalidade que demonstrava, a não ser por parte de alguns críticos mais limitados. Estranhavam estes as influências que traziam da pintura italiana do fim do século (...). Sucedia apenas que Henrique Bernardelli escapava àquele semblante do oficialismo artístico de Paris, que conformando tudo o que poderia ser admitido como pintura válida em nosso meio, acabara, por força do hábito, a assemelhar-se a uma condição marcante da criatividade nacional. (...) O que havia de mais particular na obra trazida pelo jovem pintor recém-chegado era o aspecto de uma pintura nova para o que aqui se conhecia. Não exatamente a diferença de um academismo francês em relação a outro italiano, mas principalmente pelo artista desfazer-se de preocupações técnicas e estéticas conservadoras e abrir uma nova visão para a pintura (...). Logo se deixa perceber, nas telas trazidas por Henrique, que muito havia de popular, de tendência a acentuar a naturalidade das coisas, dos fatos, enfim uma visão subordinada às sugestões diretas da natureza, o que exigia desprendimento técnico e capacidade de improvisação para o domínio sobre novos efeitos visuais".
Quirino Campofiorito (História da pintura brasileira no século XIX. Prefácio Carlos Roberto Maciel Levy. Rio de Janeiro: Pinakotheke, 1983. 292 p. , il color)
"Bernardelli é um robusto moço dotado de talento omnímodo e, por hereditariedade, de verdadeiro sentimento artístico. Os seus trabalhos inculcam um temperamento irrequieto, nervoso, sôfrego de impressões, uma dessas organizações atléticas, munidas de espátulas largas, forte peito, músculos desenvolvidos e reforçados pelo higiênico exercício das caminhadas ao ar livre, pelo alto das montanhas. A sua obra é vigorosa, original, cheia de calor, cheia de ousadia. Cheia de ousadia! sim, porque ela é nova, porque ultrapassa os arruinados sistemas da confecção acadêmica, porque faz sentir o caráter essencial do objeto, segundo a expressão de H. Taine; porque comove e é pessoal e é verdadeira. Veja-se um quadro de mestre, qualquer dos 'nossos mestres' e enquanto a obra deste consegue, unicamente, da nossa atenção um qualificativo, algumas vezes destilado pela complacência; a obra daquele nos impressiona, nos desperta alguma emoção nova, nos provoca admiração ou ódio. Eis onde está a superioridade do artista".
Gonzaga Duque (A arte brasileira. Introdução Tadeu Chiarelli. Campinas: Mercado de Letras, 1995. 270 p.)
Prêmios:
1871 - Menção em Desenho de ornatos
1872 - Pequena medalha de ouro em Desenho figurado
1873 - Menção em Desenho figurado
1874 - Grande medalha de ouro em Desenho figurado
1876 - Medalha de prata em Pintura histórica
1877 - Pequena medalha de ouro em Pintura histórica e Pequena medalha de ouro em Modelo vivo
Exposições Individuais
1886 - Rio de Janeiro RJ - Individual, na Enba
Exposições Coletivas
1870 - Rio de Janeiro RJ - 21ª Exposição Geral de Belas Artes, na Aiba
1884 - Rio de Janeiro RJ - 26ª Exposição Geral de Belas Artes, na Aiba - medalha de ouro de 1ª classe
1886 - Rio de Janeiro RJ - Nicolau Facchinetti e Henrique Bernardelli, na Imprensa Nacional
1887 - Rio de Janeiro RJ - Antônio Parreiras, Castagento e Henrique Bernardelli, no Grêmio de Letras e Artes.
1889 - Paris (França) - Exposição Universal - medalha de bronze
1890 - Rio de Janeiro RJ - Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1894 - Rio de Janeiro RJ - 1ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1895 - Rio de Janeiro RJ - 2ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1896 - Rio de Janeiro RJ - 3ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1897 - Rio de Janeiro RJ - 4ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1898 - Rio de Janeiro RJ - 5ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1900 - Rio de Janeiro RJ - 7ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1901 - Rio de Janeiro RJ - 8ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1902 - Rio de Janeiro RJ - 9ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1903 - Rio de Janeiro RJ - 10ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1904 - Rio de Janeiro RJ - 11ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1905 - Rio de Janeiro RJ - 12ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1907 - Rio de Janeiro RJ - 14ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1909 - Rio de Janeiro RJ - 16ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1910 - Rio de Janeiro RJ - 17ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1911 - São Paulo SP - Primeira Exposição Brasileira de Belas Artes, no Liceu de Artes e Ofícios
1916 - Rio de Janeiro RJ - 23ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1927 - Rio de Janeiro RJ - 34ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1928 - Rio de Janeiro RJ - 35ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1929 - Rio de Janeiro RJ - 36ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1930 - Rio de Janeiro RJ - 37ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1931 - Rio de Janeiro RJ - Galeria Irmãos Bernardelli, no Mnba
1931 - Rio de Janeiro RJ - Salão Revolucionário, na Enba
1933 - Rio de Janeiro RJ - 40ª Exposição Geral de Belas Artes, na Enba
1934 - Rio de Janeiro RJ - 3º Salão do Núcleo Bernardelli, na Enba
1935 - Rio de Janeiro RJ - 4º Salão do Núcleo Bernardelli, na Enba
Exposições Póstumas
1948 - Rio de Janeiro RJ - Retrospectiva da Pintura no Brasil, no Mnba
1950 - Rio de Janeiro RJ - Um Século da Pintura Brasileira: 1850-1950, no Mnba
1970 - São Paulo SP - Pinacoteca do Estado de São Paulo 1970, na Pesp
1976 - São Paulo SP - Henrique Bernardelli: uma coleção de desenhos, na Pesp
1976 - São Paulo SP - O Retrato na Coleção da Pinacoteca, na Pinacoteca do Estado
1980 - São Paulo SP - A Paisagem Brasileira: 1650-1976, no Paço das Artes
1984 - Rio de Janeiro RJ - 7º Salão Nacional de Artes Plásticas - Salão de 31, no Mnba
1984 - São Paulo SP - Tradição e Ruptura: síntese de arte e cultura brasileiras, na Fundação Bienal
1986 - São Paulo SP - Dezenovevinte: uma virada no século, na Pesp
1986 - Rio de Janeiro RJ - Henrique Bernardelli, no MNBA
1986 - Rio de Janeiro RJ - Mostra Comemorativa dos 50 Anos da Sua Morte, no Mnba
1989 - Fortaleza CE - Arte Brasileira dos Séculos XIX e XX nas Coleções Cearenses: pinturas e desenhos, no Espaço Cultural da Unifor
1991 - São Paulo SP - O Desejo na Academia: 1847-1916, na Pesp
1994 - São Paulo SP - Um Olhar Crítico sobre o Acervo do Século XIX, na Pesp
1995 - Rio de Janeiro RJ - Mostra Acervo Caixa Econômica Federal, no Espaço Arte Barrashopping
2000 - São Paulo SP - Brasil + 500 Mostra do Redescobrimento. Arte no Século XIX, na Fundação Bienal
2000 - Porto Alegre RS - De Frans Post a Eliseu Visconti: acervo Museu Nacional de Belas Artes-RJ, no Margs
2001 - São Paulo SP - 30 Mestres da Pintura no Brasil, no Masp
2001 - Rio de Janeiro RJ - Aquarela Brasileira, no Centro Cultural Light
2001 - São Paulo SP - Trajetória da Luz na Arte Brasileira, no Itaú Cultural
2002 - Brasília DF - Barão do Rio Branco: sua obra e seu tempo, no Ministério das Relações Exteriores. Palácio do Itamaraty
2002 - Niterói RJ - Arte Brasileira sobre Papel: séculos XIX e XX, no Solar do Jambeiro
2002 - São Paulo SP - Imagem e Identidade: um olhar sobre a história na coleção do Museu de Belas Artes, no Instituto Cultural Banco Santos
Fonte: HENRIQUE Bernardelli. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 19 de Jul. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7
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Vida e obra - Wikipédia
Henrique Bernardelli nasceu em Valparaíso, no Chile, em 1858 e se mudou com seus pais e irmãos - o escultor Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e o violonista e pintor Felix Bernardelli (1862-1905) - para o Rio Grande do Sul, no Brasil, no começo da década de 1860. A família transfere-se para o Rio de Janeiro em 1867. Em 1870 matriculou-se, juntamente com o irmão Rodolfo, na Academia Imperial de Belas Artes, estudando com pintores de destacada importância, como Victor Meireles e Agostinho José da Mota. Henrique torna-se aluno de Zeferino da Costa (1840-1915), Agostinho da Motta (1824-1878) e Victor Meirelles (1832-1903).
Em 1878 naturalizou-se brasileiro para poder concorrer ao Prêmio de Viagem à Europa concedido pela AIBA. Após perder o prêmio para Rodolfo Amoedo, viajou para Roma, em 1878, com recursos próprios. Em Roma, estuda e frequenta o ateliê de Domenico Morelli (1826-1901), entrando em contato com as obras de artistas como Francesco Paolo Michetti e Giovanni Segantini.
Ao retornar ao Rio de Janeiro, em 1888, Henrique realiza uma série de exposições individuais como a Exposição Universal de Paris, ganhando medalha de bronze com a tela Os Bandeirantes; em 1890, da Exposição Geral das Belas Artes, onde destaca-se com obras como Dicteriade, Tarantella e Calle de Venezia; e em 1893, da Exposição Universal de Chicago, com Messalina, Mater e Proclamação da República. É neste momento que as obras Tarantela (1886), Maternidade (1878), Messalina (1880), Modelo em Repouso (ca.1881) e Ao Meio Dia são apresentadas ao público.
Em 1891 tornou-se professor de pintura na recém-inaugurada Escola Nacional de Belas Artes e encerra seu contrato em 1905. Henrique deixa de lecionar na faculdade alegando que a instituição precisa renovar seus quadros periodicamente. Ele e seu irmão Rodolfo passam a lecionar em um ateliê particular no Rio de Janeiro. Lucílio de Albuquerque (1885-1962) e Georgina de Albuquerque (1885-1962), Eugênio Latour (1874-1942), Hélios Seelinger (1878-1965) e Arthur Timótheo da Costa (1822-1922) são um dos seus principais alunos de destaque.
O artista manteve vivo o contato com a cultura figurativa italiana, viajando constantemente para cidades como Roma, Nápoles e Veneza. Lecionou na Escola até ser substituído por Eliseu Visconti, em 1906, passando então a dar aulas particulares em seu ateliê, recebendo concomitantemente encomendas particulares.
Em 1916, conquistou uma das mais altas premiações que um artista plástico pode aspirar no Brasil: a medalha de honra. Foi também membro do Conselho Superior de Belas Artes, para o qual prestou relevantes serviços.
Grande parte da obra de Henrique Bernardelli foi doada à Pinacoteca do Estado conforme mostra o seu último catálogo.
Vê-se uma herma sua na Praça do Lido, em Copacabana, obra do escultor Leão Veloso.
Em 1931, o Núcleo Bernardelli, em homenagem aos professores Henrique e Rodolfo, foi criado por diversos pintores insatisfeitos com o modelo de ensino da Enba que buscavam criar um grupo voltado ao aprimoramento técnico e a reformulação do ensino artístico.
Retrato de Machado de Assis
Em 1905, Henrique Bernardelli pintou o retrato a óleo oficial do escritor brasileiro Machado de Assis, transformando a obra em uma iconografia machadiana. A tela, segundo historiadores, foi uma encomenda para decorar uma sala da Academia Brasileira de Letras, tendo assim efeito publicitário - caracterizando o retrato pelo sua austeridade e impecabilidade mobiliária e roupa sofisticada. Henrique pinta Machado de postura firme, acentuando a linguagem clássica da pintura. O Doutor em Literatura, Victor da Rosa, traduz a ideia que o retrato procura passar da seguinte forma:
“ Dessa vez Machado aparece não mais como o escritor em ascensão (...) e sim como um verdadeiro burocrata das letras, canonizado pelas instituições, alguém que subiu todos os degraus possíveis no processo de legitimação dentro do sistema literário. ”
Atualmente, o retrato ainda localiza-se na sala da Academia brasileira de Letras, junto com o busco de bronze de Machado, feito pelo escultor Jean Magrou.
Henrique Bernardelli e o Museu Paulista
Com o centenário da independência do Brasil (1922), o historiador Afonso d'Escragnolle Taunay, então diretor do Museu Paulista, aproveitou a data comemorativa para colocar em prática um projeto voltado à memória da nacional. Taunay elaborou a organização de oito salas voltas a memória paulista de forma linear e evolutiva. Para isso, o diretor convidou alguns pintores, sendo Henrique Bernardelli um dos convidados mais ilustres. Em 1921, Bernardelli e Rodolpho Amoedo, ambos com sessenta e quatro anos, foram convidados - já que pertenciam a Escola Nacional de Belas Artes (Anba) no Rio de Janeiro. Na época, Henrique não lecionava mais na Anba, mas recebia encomendas oficiais, como o retrato do presidente Epitácio Pessoa, feito no mesmo ano.
A primeira versão do quadro O Ciclo de Caça ao Índio foi rejeitada por Taunay pelo cachorro que acompanhava o bandeirante e o chicote de couro em sua mão. Tais objetos poderiam desvalorizar a imagem do bandeirante, o que não correspondia com a imagem heroica que o diretor queria transmitir. Para Maraliz de Castro Vieira Christo, Doutora em História pela UNICAP, Henrique Bernardelli entrou em um conflito ter que retratar o bandeirante como herói sem mostra-lo como um algoz caçar do índio, tendo em vista a simbologia do mesmo que a partir da metade do século XIX passou a ser visto como "simbolo nacional, não podendo ter sua imagem associada ao canibalismo e à barbárie, que, antes, justificava a sua caça e seu aprisionamento".
A solução, segundo a Doutora, foi minimizar o enfoque relativo a escravidão indígena, deslocando a atenção para o sofrimento do homem branco no processo "civilizador". Assim, encontramos uma humanização do bandeirante e o retratando como um ser predominantemente vencido pela natureza (contrapondo-se ao projeto do Museu Paulista).
Obras Decorativas
Henrique também é responsável por importantes trabalhos decorativos, tanto em São Paulo como no Rio de Janeiro.
Os painéis O Domínio do Homem sobre as Forças da Natureza e A Luta pela Liberdade, para a Biblioteca Nacional e o teto de uma das salas do Theatro Municipal (1908), ambos no Rio de janeiro, são referência da pintura brasileira do século XX. O edifício do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA) também teve a obra de Henrique em 22 medalhões em afresco que adornam sua fachada.
Análise
O trabalho de Henrique Bernardelli marcou a história da arte brasileira e influenciou dezenas de pintores do século XX como, Manoel Santiago, Bustamante Sá, Bruno Lechowski entre outros.
Fonte: Wikipédia, consultado pela última vez em 23 de janeiro de 2020.
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Henrique Bernardelli, por José Roberto Teixeira Leite
“Os defeitos de Bernardelli foram qualidades. Um revolucionário, um inovador, não pode ser um frio desenhador da linha, nem um colorista preciso. É necessário que ele seja diferente, que seja resoluto, que pinte o que sente sem artifícios antigos, mas por artifícios modernos, porque, afinal de contas, o estilo não é mais do que um artifício empregado para exprimir as nossas emoções”.
A incompreensão de crítica e público em face da mostra de 1886 parece ter arrefecido o ímpeto do jovem artista que, a partir de então, e apesar de poucas obras notáveis, tornou-se mais cauteloso e conservador. Perderia algo daquela "maneira sólida, segura e franca" dos quadros realizados na Itália, adotando um estilo mais convencional, que por volta de 1908 chegara ao esgotamento e à conseqüente repetição: já no Salão de 1904, os retratos de Machado de Assis e Ubaldino do Amaral que expõe, merecem de Gonzaga Duque o reparo de que foram "pintados por mão de mestre, mas, não sei porque, temperados com chocolate".
Na verdade, como tantos de nossos melhores pintores de seu tempo, Henrique Bernardelli teve de seguir as duas únicas opções que se abriam a um artista brasileiro: lecionar, ou executar retratos e encomendas oficiais. Foi o que fez, dobrando-se, assim, ao gosto tradicional. De 1891 a 1905, lecionou na Escola Nacional de Belas Artes. Homem de probidade e de idéias arejadas, não aceitou que seu contrato fosse renovado naquele último ano, alegando que aos alunos devem ser oferecidos, de tempos em tempos, novos professores, para que o ensino não se torne esclerosado! Passou a ensinar pintura em sua propria residência em Copacabana, por onde passaram, entre inúmeros outros, Lucílio e Georgina de Albuquerque, Eugênio Latour, Helios Seelinger e Artur Timóteo da Costa. Prova concreta de quanto eram prezados pelos jovens artistas os dois Bernardelli, Rodolfo e Henrique, deu-se em 1931, quando um grupo de alunos da Escola Nacional de Belas Artes criou um ateliê livre de pintura, nos porões da instituição, batizando-o com o nome de Núcleo Bernardelli.
Pintor decorativista, Bernardelli fez painéis para o Teatro Municipal, para a Biblioteca Nacional, para o Cinema Pathé-Palácio; trabalhou ainda para o Museu Paulista. Mas suas obras mais importantes, no gênero, são os 22 medalhões em afresco que ornam a fachada do atual prédio do Museu Nacional de Belas Artes, na Avenida Rio Branco, expostos em 1916 no Salão e que lhe valeram a medalha de honra.
Bernardelli teve defensores entusiásticos, mesmo no ocaso da sua carreira. Assim, Angione Costa dele fala, em A inquietação das abelhas, de 1927:
“Henrique Bernardelli é um pintor que, na segunda metade da vida, sem marcar uma evolução acentuada, consegue entretanto, pintar belos quadros, nos quais o colorido é uma maravilha, e o seu pincelar seguro, um prodígio de concisão”.
Exagero sem dúvida, porquanto, após os 50 anos, Bernardelli aquietara-se, perdera os ferrões da mocidade, academizara-se em suma. O que doravante iria perpassar em sua produção seriam ecos do que anteriormente fizera, produtos concebidos e executados mecanicamente e sem emoção; nem mais aqueles "temas helênicos, influência da dança antiga, raras ressonâncias simbolistas", ou os modismos estilísticos Belle Époque que lhe surpreendeu Mário Barata; mas as composições do tipo A saúde da bela!, de um rococó anacrônico e anêmico, chupado em Fragonard e em outros artistas franceses do séc. XVIII e mesmo do séc. XIX. A que distância está-se, já agora, de Messalina, ou dos Bandeirantes!.
Henrique Bernardelli foi pintor de história e de gênero, retratista e paisagista. Praticou diversas técnicas - o óleo, a têmpera, o fresco, o pastel, a aquarela, a água-forte. Sua produção encontra-se distribuída principalmente entre o Museu Nacional de Belas Artes (120 obras de diferentes épocas e técnicas) e a Pinacoteca do Estado de São Paulo (344 desenhos, 41 aquarelas e ainda óleos). Maternidade, Tarantela, Bandeirantes, Proclamação da República são seus quadros mais conhecidos, mas não forçosamente os melhores, pois o verdadeiro Bernardelli revela-se em detalhes, aqui na vibração de uma nota de cor, ali na elegância de um arabesco ou num trecho de fatura surpreendentemente moderna, feito mediante um pincelar ágil e seguro.
José Roberto Teixeira Leite (Extraído do livro Dicionário crítico da pintura no Brasil, ArtLivre, Rio de Janeiro, 1988)
Fonte: Artedata, publicado por Carlos Roberto Maciel Levy, crítico e Historiador de arte, texto original de
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Henrique Bernardelli
Parece que era coisa de destino, o menino Henrique Bernardelli ter se tornado um artista. Tinha nas veias uma herança difícil de evitar, pois era filho de pai violinista russo e uma mãe bailarina francesa. Nasceu no Chile, mais precisamente a 15 de julho de 1857 e faleceu no Rio de Janeiro, a 6 de abril de 1936. Os pais vieram para o Rio Grande do Sul, bem no início dos anos de 1860, radicando por lá. Isso após terem feito um longo trajeto do México até o Chile. A ida para o Rio de Janeiro foi um convite feito por D. Pedro II, em 1865, quando conheceu os Bernardelli em Porto Alegre. A ida da família se deu em 1867.
Henrique Bernardelli encontrou um terreno fértil para os estudos. Matriculou-se na Academia Imperial de Belas-Artes, onde cursou até 1878. Teve como mestres ninguém menos que Zeferino da Costa, Vítor Meireles e Agostinho da Mota. Durante o curso, expôs várias vezes e em diversas delas recebeu importantes condecorações. Porém, não conseguiu o prêmio de Viagem à Europa, que o Imperador fornecia ao artista vencedor de cada salão. Foi derrotado nessa disputa por Rodolfo Amoedo. Um tanto quanto frustrado com o acontecido, decide ir para a Itália, por conta própria, a fim de polir seus estudos. Radicando-se em Roma, torna-se aluno de Domenico Morelli.
Da produção que fez na Itália, voltou um artista mais seguro, com um estilo próprio e uma certa firmeza no traço, bem diferente do que se fazia por aqui. Talvez por isso, sua exposição individual, realizada em 1886, não conquistou o gosto do público, mesmo exibindo obras que hoje são consagradas, como Tarantela, Maternidade, Messalina, Modelo em Repouso e Ao meio dia. Depois do ocorrido, tornou-se um artista mais conservador e cauteloso, perdendo um pouco da solidez adquirida na Itália e adotando um estilo mais convencional, que comprometeria um pouco sua carreira, a partir de 1908. A escolha por um estilo mais discreto e tradicional não era o que exatamente queria o artista. Como muitos grandes artistas de seu tempo, Bernardelli precisou seguir as duas únicas opções dispostas a quem viesse a produzir arte: lecionar, ou executar retratos e encomendas oficiais. E foi o que fez!
Entre os anos de 1891 e 1905, lecionou na Escola Nacional de Belas-Artes, rompendo o contrato com a escola quando viu que já não era mais possível continuar com os mesmos métodos de ensino. Passa, então, a lecionar em sua própria residência, em Copacabana, onde recebe diversos alunos, vindo a destacar entre eles, Lucílio e Georgina de Albuquerque, Eugênio Latour, Hélios Seelinger e Artur Timóteo da Costa. Os irmãos Rodolfo e Henrique Bernardelli eram muito queridos de seus discípulos, prova disso é que, em 1931, um grupo de alunos da Escola Nacional de Belas-Artes criou um ateliê livre de pintura, nos porões da instituição e deram a ele o nome de Núcleo Bernardelli.
Bernardelli era um artista versátil e tornou-se um pintor decorativista, por excelência. Realizou painéis para o Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional e para o Cine Pathé. Realizou também algumas obras para o Museu Paulista. Mas, no gênero decorativo, suas obras mais importantes são os 22 medalhões em afresco, que ornamentam a fachada do Museu Nacional de Belas-Artes, na Avenida Rio Branco. Obras que lhe valeram a Medalha de Honra, no salão de 1916.
O Museu Nacional de Belas-Artes possui 120 obras suas, de diferentes épocas e técnicas. Na Pinacoteca do Estado de São Paulo estão mais diversos trabalhos, cerca de 344 desenhos, 41 aquarelas e vários óleos. Em suma, era bem eclético. Foi um pintor de história e de gênero, retratista e paisagista. Utilizou diversas técnicas: óleo, têmpera, afresco, pastel, aquarela e água-forte.
Fonte: Jose Rosário Art, publicado por Jose Rosário em 7 de julho de 2012.
Crédito fotográfico: Jose Rosário Art, Henrique Bernardelli em foto de 1933.
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Núcleo Bernardelli
Fundado em 12 de junho de 1931 por um conjunto de pintores comprometidos com a oposição ao modelo de ensino da Escola Nacional de Belas Artes - Enba, o Núcleo Bernadelli possui como metas centrais a formação, o aprimoramento técnico e a profissionalização artísticos. "Queríamos liberdade de pesquisa e uma reformulação do ensino artístico da Escola Nacional de Belas Artes, reduto de professores reacionários, infensos às conquistas trazidas pelos modernos", afirma Edson Motta (1910 - 1981), um dos líderes do grupo. Além de democratizar o ensino, o grupo almeja permitir o acesso dos artistas modernos ao Salão Nacional de Belas Artes e aos prêmios de viagens ao exterior, dominados pelos pintores acadêmicos. O nome do grupo é uma homenagem clara a dois professores da Enba, Rodolfo Bernardelli (1852 - 1931) e Henrique Bernardelli (1858 - 1936), que no final do século XIX, insatisfeitos com o ensino da escola, mas também movidos por interesses políticos-administrativos, montam um curso paralelo na Rua do Ouvidor, no centro da cidade do Rio de Janeiro. O Núcleo Bernardelli funciona primeiramente no Studio Nicolas, do fotógrafo Nicolas Alagemovits, e muda-se em seguida para os porões da Enba, onde funciona até 1936. Nessa data, transfere-se para a Rua São José, depois para a Praça Tiradentes, n. 85, até a sua extinção em 1941. Participam do também denominado "ateliê livre", os pintores: Ado Malagoli (1906 - 1994), Bráulio Poiava (1911), Bustamante Sá (1907 - 1988), Bruno Lechowski (1887 - 1941), Sigaud (1899 - 1979), Camargo Freire (1908 - 1988), Joaquim Tenreiro (1906 - 1992), Quirino Campofiorito (1902 - 1993), Rescála (1910 - 1986), José Gomez Correia, José Pancetti (1902 - 1958), Milton Dacosta (1915 - 1988), Manoel Santiago (1897 - 1987), Yoshiya Takaoka (1909 - 1978) e Tamaki (1916 - 1979).
A criação do Núcleo Bernadelli remete a um contexto artístico, dos anos 1930 e 1940, atravessado por tentativas de ampliação dos espaços da arte e dos artistas modernos, por meio da criação de grupos e associações. A Pró-Arte Sociedade de Artes, Letras e Ciências (1931) e o Club de Cultura Moderna (1935), no Rio de Janeiro, ao lado de agremiações paulistanas como Clube dos Artistas Modernos - CAM, a Sociedade Pró - Arte Moderna - SPAM, ambos de 1932, o Grupo Santa Helena (1934) e a Família Artística Paulista - FAP (1937) são expressões do êxito do associativismo como estratégia de atuação dos artistas na vida cultural do país na época. Cada qual à sua maneira, esses grupos problematizam o legado do modernismo. Um outro esforço de modernização do ensino artístico pode ser localizado na tentativa de reforma da Enba, empreendida por Lúcio Costa (1902 - 1998) ao assumir a direção da escola, em 12 de dezembro de 1930.
Se o Núcleo Bernadelli é concebido em consonância com os projetos modernos em gestação e desenvolvimento, seu funcionamento parece mais voltado para uma tentativa de ocupação de espaço profissional do que de reformulação da linguagem artística. Trata-se fundamentalmente de incentivar o estudo e a formação pela criação de um lugar para convivência, troca de idéias e aprendizado. Desenho com modelos vivos, pintura ao ar livre, nus, naturezas-mortas, retratos e auto-retratos são realizados no ateliê, que promove também exposições das obras. Entre 1932 e 1941 são realizados cinco salões dos integrantes do Núcleo Bernadelli. Além disso, em 1933, o conjunto dessas obras é exposto no Studio Eros Volúsia e, em 1934, em mostra promovida pela Sociedade Brasileira de Belas Artes. Além das paisagens, amplamente realizadas, os artistas do grupo pintam cenas urbanas e figuras humanas. Alguns críticos sublinham a inspiração impressionista desse paisagismo, além da influência construtiva de Paul Cézanne (1839-1906), sobretudo nas naturezas-mortas de Milton Dacosta. Mas é possível localizar em parte da produção do grupo - em Malagoli, por exemplo - afinidades com o ideário do retorno à ordem. Alguns trabalhos de Malagoli, Sigaud e Campofiorito, por sua vez, anunciam questões sociais, em pauta nas manifestações artísticas da década de 1930.
Os nomes de José Pancetti e Milton Dacosta, egressos do grupo, destacam-se posteriormente em função das marcas inovadoras e pessoais dos seus trabalhos. Pancetti se notabiliza pelas marinhas que realiza, além dos diversos retratos e auto-retratos. Os anos de 1950, considerados o ápice de sua produção, conhecem as célebres Lavadeiras na Lagoa do Abaeté, as paisagens de Saquarema e cenas de Mangaratiba. Atento, desde o início de sua obra, aos desafios da composição e ao uso da cor, seus trabalhos dos anos de 1950 enfatizam a organização dos planos geométricos, fazendo com que beirem a abstracão. Milton Dacosta, responsável por uma obra convencionalmente dividida em fases em função das influências que recebe - Paul Cézanne, De Chirico (1888 - 1978), Pablo Picasso (1881 - 1973) e Giorgio Morandi (1890 - 1964) -, esteve sempre preocupado com a esquematização das formas, e recusa mesmo em suas obras figurativas dos anos 1930, qualquer inclinação naturalista mais direta. As lições construtivas, as deformações picassianas e cubistas, o equilíbrio entre planos colorísticos são todas preocupações precoces de seu trabalho (vide Paisagem de Santa Teresa, 1937), indica Mário Pedrosa (1900 - 1981). Por essa razão, o crítico defende que o abstrato é "o ponto de partida do pintor", e não apenas a marca de sua obra após a década de 1950.
Fonte: NÚCLEO Bernardelli (Rio de Janeiro, RJ). In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em: Itaú Cultural. Acesso em: 19 de Jul. 2017. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7